"Vem o inverno e os montes pedregosos, as árvores despidas, a natureza inteira envolve-se numa grande nuvem húmida que tudo abafa e penetra. As coisas di-las-íeis recolhidas e cismáticas.
É um rolo misterioso e profundo que vem dum mar desconhecido. E a chuva começa, o ruído doce da chuva que faz sonhar em tantas coisas idas e tristes! Primeiro a terra embebe-se e incha. E, depois de cheia, a torrente jorra até polir as pedras: ara, põe raízes à mostra, arrasta na aluvião o húmus, as folhas secas das árvores, os cadáveres dos bichos, os detritos desagregados das rochas, que rola juntos, dispersa e reúne, atira, entre a baba da água para um destino ignoto."
Raul Brandão, Os pobres
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