quarta-feira, maio 31, 2006

terça-feira, maio 30, 2006

Os dados estão à vista de toda a gente. Refiro-me aos mostrados e explicados por Medina Carreira, um dos poucos portugueses que parece saber ainda o valor da realidade e do dizer-se a verdade sobre ela.
O programa de ontem, do "Pros e Contras" foi , em si mesmo, um bom exemplo do nosso drama: A apresentadora parecia acima de tudo interessada na revisão da constituição e em possíveis recados do Eng. Belmiro ao Governo. O senhor da Galp que ficou ao lado do Dr. Medina Carreira veio falar da "excelência" e dos optimismos e ficou, claro está, calado, quando lhe foi lembrado que o crescimento de 0,6 foi o que conseguimos com todas essas virtudes...
Mas alguém realmente perigoso é o estimável Dr. Silva Lopes: é bem intencionado, honesto e parece sensato, com os seus gradualismos ficando, por vezes, o Dr. Medina Carreira com o papel de louco exaltado. E afinal... é devido ao "bom senso" dos Drs. Silva Lopes deste país que estamos como estamos... é devido a esses cuidados que diariamente a nossa situação se agrava...
No final, entre alguns prognósticos espectaculares, dramáticos, de guerras civis e outras palermices, a nota de realidade foi dada, de novo pelo Dr. Medina Carreira que apenas falou do nosso mais óbvio e pacífico futuro: a pobreza, apagada, calma e vil.
Uma amável leitora deste blog (que redundância!) situou a ida de Bergotte à exposição no 5º volume da RTP Recherche Temps Perdu), a páginas 177 da edição da Relógio de Água (a traduzida por Pedro Tamen). Na minha edição, a da Livros do Brasil, a páginas 174. Aproveite-se e leia-se.
Mas o episódio não era, afinal, aquilo que tinha referido. Aquele de eu que falava é uma descrição de um quadro, ou meramente de uma cor, ou de uma textura que, pareceu-me quando li, exige de nós uma fusão entre os olhos da corpo e os do espírito, da alma (como Santa Teresa de Ávila distinguia), a um ver que se transmuta em visão, em luz sobre este mundo (e sobre nós nele) no limite do suportável por uma pobre mente ocidental.
Vou continuar a procurar.

segunda-feira, maio 29, 2006

Li Monsieur Proust até bastante tarde. As despesas que este fazia - e que horrorizavam e preocupavam a sua empregada - pôde fazê-las porque sua Mãe tudo fez para que ele tivesse rendimentos suficientes para viver e escrever sem os constrangimentos das faltas de dinheiro. Proust foi, nesse sentido, um escritor planeado (com a minúcia que hoje em dia se guarda para os atletas olímpicos ou estrelas de cinema). E, também, toda as suas excentricidades foram, afinal, medidas ponderadas de gestão: sendo a sua obra o único fim importante, tudo o mais, conveniências sociais, horários, tudo foi moldado para que a sua obra pudesse ser terminada.

Céleste Albaret fala, de quando em vez, da saída de Proust para rever um quadro de Vermeer, saída que este, creio, utilizou na sua obra. Mas, nascidas dessa ida ou de outra, anterior, aconselho a todos que leiam ou releiam essas considerações sobre a textura de uma parede de um muro que, foram, creio, das coisas mais assombrosas que alguma vez li. Está no último volume da RTL, no "Tempo Reencontrado"*.

* Não está. Está na Prisioneira ou na Fugitiva (já folheei a Prisioneira e não encontro, creio que o capítulo sobre a morte de Bergotte está na Fugitiva que não sei onde pus....). E não é uma parede de um muro: é o "petit pan de mur jaune"; podem ler mais aqui.

domingo, maio 28, 2006

Deliciei-me com a etimologia de Charlotte e, porque estou cada vez mais ingrato, ao invés de agradecer e por aí ficar, sempre direi que o dito no Bomba sobre a lavagem dos lenços de assoar de Monsieur Proust é uma memória falsa, como tive ontem o prazer de descobrir!
O que aconteceu foi que Céleste, a Albaret, encarregada, uma vez, de comprar lenços para Proust, comprou, por mais baratos, uns menos bons do que aqueles que o Escritor usava, na campónia esperança que este não percebesse e assim poupasse uns cêntimos. Proust, claro está, deu pela diferença. Céleste lavou e relavou os lenços e após uma segunda tentativa de o fazer usá-los, disseminando-os na pilha dos lenços, tentativa gorada pela meticulosidade das mucosas do grande escritor, ainda persistiu, com mais lavagens, etc., uma terceira vez. Proust, sem esgotar a sua bonomia, viu-se obrigado a cortar com uma tesoura de unhas um desses lenços à frente de Céleste, para que esta compreendesse quão vãs seriam as possibilidades de ludibriar o Escritor.
Sobre isto, construiu a memória benfazeja da Ilustre Bloguista uma história de piedosa devoção albaresca. Não, minha senhora, tudo não passou de uma tentiva desastrada de encobrimento de uma sovinice (ainda que por interposto pecúlio).

sexta-feira, maio 26, 2006

Ainda o abalo

Na "votação" uma forma de inquérito no Sapo, à declaraçao de Welsh sobre a necessidade do "grande abano" 85,1% dos "votantes" declaram que é necessário um não pequeno abano salvador... 10,2% ficam-se pelo talvez e 4,7% discordam dessa necessidade. O que valem estas "consultas" a gente sabe. Mas 85%? Creio que tenho razão: o governo está a governar com medos e cuidados que já não são necessários há anos. Bem sei que seria necessário o sacrifício de parte da classe média, dos seus previlégios, e que chegada a altura... mas mesmo assim, não sei se não seria possível dar o pulo para os tempos de hoje. Nem ninguém sabe ou saberá, enquanto nao surgir a coragem de propor um país radicalmente diferente - aquilo que está a ser feito no resto do mundo, a começar por aqui ao lado, em Espanha, e que aqui ainda é mera especulação de café, ou de blog.

Portugal precisa de um «grande abalo»

diz Welsh, segundo as notícias do Sapo:

"Portugal é visto no estrangeiro como um país em contínua degradação e declínio no que respeita ao mais variados indicadores económicos, necessitando de um «grande abalo». O retrato negro é traçado pelo guru da gestão norte-americano, Jack Welch.
«Ele (Jack Welch) diz que é humilhante para os portugueses a percepção que o exterior tem de Portugal, com uma contínua degradação e declínio ao longo dos últimos anos», disse Mira Amaral.
A educação, formação profissional, inovação, investigação, desenvolvimento tecnológico e níveis de exportação foram alguns dos exemplos apontados. «Se compararmos o crescimento com o dos países da Europa do Leste, com a Irlanda ou Espanha , eu ficaria embaraçado com o desempenho económico português», afirmou."

O resto... são diversões fúteis

The "Circle Theatre" de Hopper (1936) que pode ser visto enquanto se escuta "Quiet City" de Copland (de 1940, a partir da música que tinha composto para a peça de Irwin Shaw com o mesmo nome).

quinta-feira, maio 25, 2006

Ora, coff, coff, peço a atenção das minhas Senhoras e Senhores Leitores:

"Aujourd'hui j'ai compris que toute la recherche de M Proust, tout son grand sacrifice à son oeuvre, cela a été de se mettre hors du temp pour le retrouver. Quand il n'y a plus de temps, c'est le silence. Il lui fallait ce silence pour n'entrendre que les voix qu'il voulait entrendre, celles qui sont dans ses livres."

Quem fala assim é Céleste Albaret, a empregada doméstica de Proust. Que cada leitor retire da caixa de suspiros de resignação um ou mais enquanto medita sobre o actual momento da literatura portuguesa, crítica da mesma, frases e dichotes de autores, etc, etc.

quarta-feira, maio 24, 2006

Há anos que andava para comprar o livro de Céleste Albaret. Há dias assisti a esta conversa e, milagre de internet, encomendei naquele mesmo momento, juntamente com um outro de Berlin. Recebi-os hoje, neste dia tépido e perfumado, Maio perfeito.

Ah, do livro já li umas páginas. Já nao me lembro, quando li sobre este "Monsieur Proust", se foi escrito ou meramente ditado e sujeito a arranjos posteriores. A terem existido, tais arranjos não toldaram a voz de Albaret, já que apenas quem viveu o que conta conta assim. Acreditei, por isso, no que li e o estudo daqueles mecanismos de defesa contra o quotidiano, através da imposição - melhor diria proclamação - do seu próprio ciclo circadiano àquela orbe -o seu apartamento, à pequena população dele - que manancial de exercícios de negociação com o destino!
Vim aqui, já sonolento, fechar o computador e acabei por ler alguns posts de alguns blogs. Estou alheado do que se discute em Portugal, descubro, e não tenho interesse em informar-me.
Tenho saudades kitsch do Portugal rural e etnográfico que ainda conheci e que só encontro em alguns livros com uma forma rara e já desconhecida de se encurvarem nas estantes (nesse escorregar ameno, não no que se lê neles) e noutras coisas miúdas, no ser de noite, mais escuro, a terra onde vivo tremeluzia pequenina, lá no cimo e, de volta, a escuridão onde as aldeias dormiam o serem assim desde Júlio Diniz.
E é disto que gosto, do mesmo modo que volto aos Cadernos de Malte ou aos Buddenbrook ou... de preferência a qualquer coisa de que se fale agora.
Suspiro convicto.

terça-feira, maio 23, 2006

Nem um protesto, nem um insulto! Que afronta!
Eu confesso: comecei este blog para mim, como exercício, como disciplina - não tenho nada de interessante a dizer a ninguém e, se o tivesse, não o diria. No entanto, com tanto mecanismo de medição, com tanta competição, em breve me interessei pelo número de leitores e dei por mim a magicar promoções de supermercado. As promoções não pagaram, como se diz agora, mas a minha mancheia de leitores alegrava-me e bastava-me. Eis senão quando fui de novo tomado pela mania do sucesso e resolvi seguir o caminho torpe da transgressão, transformando este blog, até agora pacato, num - e digamo-lo sem mais - num "blog com gajas nuas" que, deveria ofender, em vários pontos, o Código Pacheco-Hays . E após a introdução audaciosa do nu, sentei-me e esperei a enchente esperada, conforme o que lera.
E, meus leitores, nada! Nem uma indignação, nem um insulto, nem enchente! Ó minha mancheia de leitores, alguns mães, outros pais de família, a que indiferença nos conduziu a perversidade que campeia! Mas não pode ser! Têm de tomar uma posição, obrigar-me a apagar o post de ontem, aquele enganoso "jardim medieval, tarde de Maio" que mais não é que uma enorme pouca vergonha! Revoltem-se, caros leitores, e digam bem alto da vossa revolta até que eu capitule e seja forçado a retirar o afrontoso post dito "medieval".

sábado, maio 20, 2006

Há uma altura em que um pobre homem de meia idade, esquecido dos seus sonhos de Rebeccas de Mornay's de 4 divórcios aos 50 e 7 edições da biografia aos 100 (onde constaria de modo lisonjeiro "as a cheer lover and a gentleman") se decide a aceitar a vida tal qual ela é! Procura uma rapariga de aspecto fresco, simples, e com um sereno e lhano encanto ("Any girl can be glamorous. All she have to do is stand still and look stupid"she said), que se divirta com coisas comuns, que se entretenha com os seus pequeninos segredos e... e é uma tal dificuldade que quase se desanima!

sexta-feira, maio 19, 2006

Detesto incongruências, eis uma das minhas limitações. Por isso, a descida vertiginosa dos índices de Portugal entre os países da UE aquieta-me, sossega-me: da pergunta sem resposta (*) do Abrupto (a do inquérito) ao... ao resto, tudo condiz, afinal.

(*) Não, não é algo de somenos: um pedido, anunciado de forma solene, do Presidente da República feito a um dos mais importantes funcionários do Estado sobre um assunto concreto e de imediato exequível não pode ficar - como já ficou - sem resposta clara e célere.

quarta-feira, maio 17, 2006

Hoje ando na ronda dos blogs.
Parece que, tal como o Almocreve, também o Crítico faz três anos.
Muitos parabéns, sinceros e sem presente, que não sei qual pudera oferecer senão o que tenho para dar e que é o ser dele, Crítico, leitor errático, incompetente e fiel.
O Almocreve das Petas faz três anos, data importante.
O Impensável dá os seus parabéns, deseja longa vida e, num acesso impensado de generosidade, aqui deixa o seu presente.
Uma afta! Francamente, não fora aquelas amêndoas do sorvete e diria que era da prosa da Agustina: os aforismos, para aqueles males de boca, são piores de que os frutos secos, diz o povo, que nunca ninguém de mais aquilatada ciência quis opiniar.
Deste alguma coisa que é nada, ou menos ainda, mera suspeita, se faz a vox populi e muito romance em épocas de míngua.

terça-feira, maio 16, 2006

segunda-feira, maio 15, 2006

"[....] na verdade, nada me surpreendeu mais que o modo livre e desembaraçado como os rurais portugueses mantêm uma conversa, e a pureza da língua em que exprimem as suas ideias, se bem que poucos saibam ler ou escrever - ao passo que os camponeses de Inglaterra, cuja educação é, de um modo geral, muito superior são grosseiros e obtusos na conversa, por vezes a raiar a brutalidade, e absurdamente ingramáticos na linguagem - embora a língua inglesa seja, em globo, de estrutura mais simples que a portuguesa."

"George Borrow em Portugal" (1835), Livros Horizonte, Lisboa, 2006

sexta-feira, maio 12, 2006

Fui a ares, estes dias, para S. Sebastião da Pedreira, termo da cidade de Lisboa. De lá regressei hoje, cansado de tanto sobressaltado sossego. Aqui, onde ele é natural e perfeito (cheio de sons pitorescos) não tem graça nem chiste o cantar do galo que lá me encantava. Estou quase Calisto, e, anjo fora, não se me dava de cair, também, um pouco.

segunda-feira, maio 08, 2006

Tentei encontrar o meu exemplar dos Buddenbrook e a tarefa revelou-se surpreendentemente fácil. A data da compra, muitos anos atrás, em Maio. Aguentei o golpe, lembrei-me de que era um adolescente muito adolescente na altura e, benigno e sensato, felicitei-me com sinceridade por Thomas Bunddenbrook e Tony (e Sesemi) fazerem parte das minhas amizades há tanto tempo e desde tão cedo.
Neste finale, as senhoras da família interrogam-se sobre o seu destino e sobre se algum dia se reencontrarão com os seus mortos queridos.

" -Havemos de reencontrá-los - disse Friederike, há horas em que essa ideia não consola, valha-me Deus! Horas em que se duvida da justiça, da bondade... de tudo. A vida - sabem ? - quebra muita coisa em nós e destrói muitas crenças... Um reencontro... Oxalá seja verdade...
Nesse momento, porém, Sesemi Weichbrodt levantou-se junto da mesa tão alto quanto pôde. Pôs-se nas pontas dos pés; esticou o pescoço; deu palmadinhas na tábua. A toca tremia-lhe na cabeça.
-É verdade! - disse ela com todo o vigor de que dispunha, fitando as demais com olhares de desafio.
Erguia-se ali, vencedora da boa luta que, toda a vida travara contra as dúvidas da sua razão professoral, corcunda, minúscula e trémula de convicção, pequena profetiza vingadora e entusiasta."

Thomas Mann, Os Buddenbrook ed. «Livros do Brasil»

domingo, maio 07, 2006

Lembrei-me agora de Sesemi Weichbrodt, dos Buddenbrook, a que sempre tinha sabido, a que se vira obrigada a saber, a ter a certeza absoluta.
Não sei porque motivo me lembrei dela hoje, embora me lembre dela às vezes, penates lá de onde vive em mim a memória do que li.

sábado, maio 06, 2006

Muito vento, hoje. Vento deste tempo - e assim será até ao fim do Verão - de noroeste.
O som do vento é diferente do das ventanias de Inverno, ouvem-se, viçosas, as folhas das árvores.

sexta-feira, maio 05, 2006

Recebi hoje a "Queirosiana" da Fundação Eça de Queiroz e Associação de Amigos de Eça.
Leio, com interesse, "Untaming the screw: Sex, Sewers and Obscenity in A Cidade e as Serras" de Kathryn Bishop-Sánchez (a coisa não é o que parece).
Entretanto, pelo mail, um pedido da Amazon.us para classificar o desempenho da vendedora do disco que comprei, uma longínqua firma do Oregon. Dei 5, excelente: demorou pouco e chegou tudo como deve ser. Que mais podia querer?
Antes de voltar à Queirosiana, um pequeno lamento: como é irritante esta necessidade provinciana do up to date e como é ainda mais irritante percebermos que o último escândalo artístico de que demos fé já cresceu tanto que frequenta a academia... (descoberta ao ler "But is it art?", de Cynthia Freeland, comprado por erro, mas que se revelou divertido). O escândalo que referi era o de Hirst, do "The Physical Impossibility of Death in the Mind of Someone Living" que, queira-se ou não, é já do longínquo ano de 1991!

quinta-feira, maio 04, 2006

"A larga maioria dos portugueses residentes no continente não se interessa pelo país, declara-se infeliz e é pessimista quanto ao futuro" diz um estudo da TNS - que nao sei o que é.
Perante tal manifestação de bom gosto e bom senso, fiquei eu menos pessimista.

quarta-feira, maio 03, 2006

Morreu a semana passada o autor destes versos:

Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com a minha dor

Hoje pra você eu sou espinho
Espinho não machuca a flor
Eu só errei quando juntei minh'alma à sua
O sol não pode viver perto da lua
É no espelho que eu vejo a minha mágoa
É minha dor e os meus olhos rasos d'água
Eu na tua vida já fui uma flor
Hoje sou espinho em seu amor
Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com minha dor
Hoje pra você eu sou espinho
Espinho não machuca a flor
Eu só errei quando juntei minh'alma à sua
O sol não pode viver perto da lua

Guilherme de Brito

terça-feira, maio 02, 2006

EPIGRAMS
by John Donne

AN OBSCURE WRITER

Philo with twelve years' study hath been grieved
To be understood ; when will he be believed?


Só mais este outro epigrama dele, só mais este:

ANTIQUARY

If in his study he hath so much care
To hang all old strange things, let his wife beware.

segunda-feira, maio 01, 2006