Ler e meditar, com a devida vénia, do Público:
De Vasco Pulido Valente:
Solidariedade europeia
Escreveu A. J. P. Taylor que o mal da Alemanha era ser muito grande. O mal da Polónia é estar entre o poder russo e o poder alemão, representado pela Prússia e pelo Império Austríaco ou representado pelo II e o III Reich. A Polónia viveu sempre cercada e sem aliados, tirando a simpatia formal da França, que depois de Napoleão (e mesmo com ele) não contava. Por isso, desde o século XVIII, a Polónia foi "partilhada" e tornada a "partilhar" por vizinhos, que a exploravam e desprezavam. O Tratado de Versailles (1919) reconstituiu uma Polónia independente. Mas logo em 1939 Hitler e Estaline a voltaram a dividir. Durante a guerra, morreu um quinto da população, a Wehrmacht arrasou Varsóvia e, no fim, o Exército Vermelho instalou pela força um governo comunista.Em 1945, as fronteiras da Polónia mudaram. Estaline ficou com o Leste, para "protecção estratégica", e compensou o novo Estado com territórios que tinham sido secularmente da Alemanha. Por assim dizer, Estaline deslocou a Polónia umas centenas de quilómetros para ocidente. Entre 9 e 11 milhões de alemães fugiram à frente do Exército Vermelho ou emigraram a seguir. Até agora, a guerra fria e a memória do nazismo não permitiram que se tocasse no assunto. Mas, com a reunificação da Alemanha e um certo "revanchismo russo", que Putin alimenta e a derrota de Bush encorajou, o "problema polaco" reapareceu em cena. Como sempre a Rússia quer reafirmar a sua influência na região e a Alemanha, desta vez, não quer esquecer a sua história.Putin pretende (e a Alemanha aceitou) construir um gasoduto directo entre a Rússia e a Alemanha, sem passar pela Polónia. O que evidentemente permite à Rússia fazer chantagem com a Polónia (como já fez, por exemplo, com a Ucrânia). O primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, protestou. Angela Merkel tenta tratar o caso - um caso eminentemente político - como se fosse uma questão económica. Por outras palavras, solidariedade europeia ou não, a Alemanha prefere negociar com a Rússia à custa da Polónia. Pior ainda: planeia um monumento aos "deslocados" do Leste, garantindo que ele não "relativiza" a guerra do III Reich. Faz, de facto, muito mais do que isso: põe em causa a legitimidade da Polónia como ela hoje existe. Por enquanto, estas querelas não são graves. Mas servem para lembrar de onde vem o grande perigo para a "Europa".
E não vem da América.
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