quarta-feira, maio 12, 2004

Já tinha ouvido falar dela e em 1974 li, em viagem, uma biografia. "Ela" é Lou Andreas Salomé e creio que foi a última das minhas paixões "literárias" adolescentes. Ao folhear, ontem, uma outra edição, encontro um excerto do diário:
"Um diário é um instrumento que não se destina a fixar a recordação de determinados dias, mas sim de factos dissociados do tempo, duradouros. Tão depressa registamos acontecimentos como pensamentos, quando na verdade não visamos nada disso, mas antes um qualquer elemento que a vida faz crescer no seu intervalo"
Uma boa definição também para os blogs, pensei, e mesmo um programa para os blogs portugueses que têm uma desagradável propensão para o artigo de fundo.
Mas, e a terminar, escrevia Andreas-Salomé: "Às vezes é um jardim em flor que ninguém consegue adivinhar por detrás das palavras, a não ser aquele que as escreveu para si mesmo e que, ao vê-las, se recorda como murcha à vista de uma florzinha"
Numa primeira leitura, achei a última frase um péssimo fim e desisti de publicar no meu blog frases "à vista de uma florzinha". Achei a frase possidónia, para não dizer imprópria para uma citação num blog masculino. Depois, já hoje, pensei que Lou era a mulher de quem alguém disse que, quando um homem se apaixonava por ela, dava à luz um livro nove meses depois, a mulher que fez Nietszche fazer inumeráveis tristes figuras e resolvi transcrever tudo.
Que todos nós tenhamos o direito de desfalecer à vista de florzinhas..
E com isto, com a reivindicação do direito a ser ridículo, perdi o fio do post que era bem outro e metia Proust e Camilo e mais alguns daqueles que escrevem obras que crescem no intervalo das nossas vidas.

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