A pretexto dos malefícios do tabaco vem aí mais legislação limitadora dos direitos dos que fumam, em nome da saúde dos que não fumam.
Parece-me que o melhor caminho seria o de criar condições para que os que fumam o possam fazer sem incomodar os que não fumam. Mas tal legislação sai cara, já que a sua aplicação implicaria gastos para o estado (criação de salas de fumo em condições, etc., etc...) e se o estado gosta de se fingir preocupado connosco, gosta de o fazer grátis. Daí o pendor para a proibição, para a punição, em detrimento de medidas mais eficazes (criação de consultas para abandono do tabaco, por exemplo).
Aliás, o estado português tem-se mostrado totalmente incapaz de resolver qualquer problema novo (ou menos novo) que exija mais do que uma atitude punitiva ou qualqer réstea de coragem: dizem-no, com pristina clareza os números realtivos à sida, à toxicodependência, ao alcoolismo ou à sinistralidade rodoviária.
Ficam os decretos, que são baratos.
segunda-feira, maio 31, 2004
sábado, maio 29, 2004
Descobri, nos últimos anos, meia dúzia de coisas definitivas: a ária "Eternal source of light divine" do Händel, o Ice Tea Green da Lipton, as colónias inglesas do .... (informação não divulgável), Sir Isaiah Berlin (opera omnia) e esqueci uma quantidade de outras coisas definitivas que tinha descoberto em idades mais verdes, o que não deixou de ser, a seu modo, uma descoberta interessante, um troço palpável de matéria assente. Se tivesse coragem de tirar desta última todas as ilações que dela tranquilamente decorrem, descobriria que se pode viver com muito pouco e seria um candidato plausível à disciplina da aurea mediania. Infelizmente, porém, prevalece em mim o culto pela bugiganga.
sexta-feira, maio 28, 2004
quinta-feira, maio 27, 2004
Carminum 2,10
Rectius vives, Licini, neque altum
semper urgendo neque, dum procellas
cautus horrescis, nimium premendo
litus iniquum.
auream quisquis mediocritatem
diligit, tutus caret obsoleti
sordibus tecti, caret invidenda
sobrius aula.
saepius ventis agitatur ingens
pinus et celsae graviore casu
decidunt turres feriuntque summos
fulgura montis.
sperat infestis, metuit secundis
alteram sortem bene praeparatum
pectus: informis hiemes reducit
Iuppiter, idem
submovet; non, si male nunc, et olim
sic erit: quondam cithara tacentem
suscitat Musam neque semper arcum
tendit Apollo.
rebus angustis animosus atque
fortis adpare, sapienter idem
contrahes vento nimium secundo
turgida vela.
Horatius
Rectius vives, Licini, neque altum
semper urgendo neque, dum procellas
cautus horrescis, nimium premendo
litus iniquum.
auream quisquis mediocritatem
diligit, tutus caret obsoleti
sordibus tecti, caret invidenda
sobrius aula.
saepius ventis agitatur ingens
pinus et celsae graviore casu
decidunt turres feriuntque summos
fulgura montis.
sperat infestis, metuit secundis
alteram sortem bene praeparatum
pectus: informis hiemes reducit
Iuppiter, idem
submovet; non, si male nunc, et olim
sic erit: quondam cithara tacentem
suscitat Musam neque semper arcum
tendit Apollo.
rebus angustis animosus atque
fortis adpare, sapienter idem
contrahes vento nimium secundo
turgida vela.
Horatius
quarta-feira, maio 26, 2004
"Linkaram" o Impensável o Blog de Alex, o Life is just another game o Do Portugal Profundo e o Cinema Xunga 2.
O Impensável agradece.
O Impensável agradece.
terça-feira, maio 25, 2004
Por Europa e por crismas (perdõe-se-me se ofender o espírito laico) de tratados em "constituições", vem-me à memória o que ouvi, no outro dia, com delícia, o Dr. Mário Soares dizer sobre o futuro da Europa.
Dizia o ilustre ancião, laico e republicano, que as questiúnculas sobre quanto vai receber cada estado são questões de mercearia que não podem prevalecer sobre os grandes ideiais (Europa unida, "La Grande Europe" etc., etc.).
Seria divertido ouvir isto se não fosse perigoso: foram as comezinhas questões de "mercearia" ("no tax without representation") que contribuíram para o fortalecimento do parlamentarismo e da democracia; foram as "grandes e elevadas ideias" que levaram a grande parte das carnificinas que ensanguentaram a Europa.
Dizia o ilustre ancião, laico e republicano, que as questiúnculas sobre quanto vai receber cada estado são questões de mercearia que não podem prevalecer sobre os grandes ideiais (Europa unida, "La Grande Europe" etc., etc.).
Seria divertido ouvir isto se não fosse perigoso: foram as comezinhas questões de "mercearia" ("no tax without representation") que contribuíram para o fortalecimento do parlamentarismo e da democracia; foram as "grandes e elevadas ideias" que levaram a grande parte das carnificinas que ensanguentaram a Europa.
O governo socialista espanhol não concorda com a referência ao cristianismo, enquanto uma das raízes da cultura europeia, no novo tratado europeu, por pôr em causa a laicidade...
A verdade pôr em causa a laicidade, é difícil a gente perceber... mas concordo com a omissão: o tratado, abusiva mas não inocentemente apodado de "constituição", é coerente ao não respeitar a história e, a omissão de um facto indiscutível e pacífico, por indesmentível, condiz com a sua falta de verdade politítica, com o desprezo pela vontade dos europeus, com a autoritária soberba franco-alemã. Deixemo-lo ser inteiramente coerente.
Que faria, de facto, em tal documento, uma referência ao cristianismo?
Ao invés, não me parece que pecasse por atentado ao laicismo a referência à barbárie alemã de há 60 anos ou ao genocídio perpetado pelos revolucionários iluministas franceses aquando da sua revolução. Também esses horrores são raízes da cultura europeia.
Fico à espera.
A verdade pôr em causa a laicidade, é difícil a gente perceber... mas concordo com a omissão: o tratado, abusiva mas não inocentemente apodado de "constituição", é coerente ao não respeitar a história e, a omissão de um facto indiscutível e pacífico, por indesmentível, condiz com a sua falta de verdade politítica, com o desprezo pela vontade dos europeus, com a autoritária soberba franco-alemã. Deixemo-lo ser inteiramente coerente.
Que faria, de facto, em tal documento, uma referência ao cristianismo?
Ao invés, não me parece que pecasse por atentado ao laicismo a referência à barbárie alemã de há 60 anos ou ao genocídio perpetado pelos revolucionários iluministas franceses aquando da sua revolução. Também esses horrores são raízes da cultura europeia.
Fico à espera.
Há 1269 anos, em 25 de Maio de 735, morria em Jarrow, Inglaterra, S. Beda, o Venerável, um dos grandes Santos da Igreja e da minha particular devoção.
Pode-se ler aqui notícia da sua vida.
E também aqui se pode saber mais do grande Santo.
Jorge de Sena, num extraordinário conto, intitulado "Mar de Pedras", um dos meus preferidos, homenageia S. Beda.
Pode-se ler aqui notícia da sua vida.
E também aqui se pode saber mais do grande Santo.
Jorge de Sena, num extraordinário conto, intitulado "Mar de Pedras", um dos meus preferidos, homenageia S. Beda.
segunda-feira, maio 24, 2004
Escreve, a propósito de D. Duarte, Oliveira Martins n'"Os filhos de D. João I": "A literatura tem este defeito inerente; toma a nuvem por
Juno, confundindo as obras com as palavras. E o literato medíocre apresenta esta agravante: dar valor de ensino às banalidades que lhe passam pelo cérebro, como passam pela ideia de qualquer outro que, todavia, não pratica o vício de as comunicar ao próximo"
Senti-me ligeiramente ofendido, primeiro, mas a crítica, que li, repetida, em Maria Filomena Mónica a propósito dos blogs, parece-me ultrapassada tanto pela abominação romântica da banalidade, quanto por radicar numa visão ultrapassada: a de que "pôr em escrito" ou "pôr por escrito" é uma actividade nobre a que não devem aceder todas as ideias, todos os assuntos, todos os autores.
Ora, parece-me, a moderna abundância e facilidade editorial, perdida a conversa de soleira de porta, de café, de club, de serão velho de província que o século XX se encarregou de liquidar, limita-se a restituiu-nos à nossa condição de autores. Que seja de banalidades e por escrito, quanto, noutros tempos todos o eram oralmente, não me parece constituir um mal.
Mera questão de suporte.
Juno, confundindo as obras com as palavras. E o literato medíocre apresenta esta agravante: dar valor de ensino às banalidades que lhe passam pelo cérebro, como passam pela ideia de qualquer outro que, todavia, não pratica o vício de as comunicar ao próximo"
Senti-me ligeiramente ofendido, primeiro, mas a crítica, que li, repetida, em Maria Filomena Mónica a propósito dos blogs, parece-me ultrapassada tanto pela abominação romântica da banalidade, quanto por radicar numa visão ultrapassada: a de que "pôr em escrito" ou "pôr por escrito" é uma actividade nobre a que não devem aceder todas as ideias, todos os assuntos, todos os autores.
Ora, parece-me, a moderna abundância e facilidade editorial, perdida a conversa de soleira de porta, de café, de club, de serão velho de província que o século XX se encarregou de liquidar, limita-se a restituiu-nos à nossa condição de autores. Que seja de banalidades e por escrito, quanto, noutros tempos todos o eram oralmente, não me parece constituir um mal.
Mera questão de suporte.
domingo, maio 23, 2004
Entro aqui e deparo com o post anterior e não deixo de me espantar um pouco.
Convirá explicar que não fui tomado de assalto pela imprensa do coração, que não sou iberista ou bourbónico e que não segui senão longínqua e distraidamente todo o "caso" Astúrias. A explicação para o post é simples: escrevi-o debaixo da irritação produzida pelos ditos e tom dos comentadores que, com as habituais calinadas na língua pátria debitam, em tom condescendente, inanidades sob os regimes monárquicos.
Ah!, mas desejo felicidades aos Príncipes. Muitas.
Convirá explicar que não fui tomado de assalto pela imprensa do coração, que não sou iberista ou bourbónico e que não segui senão longínqua e distraidamente todo o "caso" Astúrias. A explicação para o post é simples: escrevi-o debaixo da irritação produzida pelos ditos e tom dos comentadores que, com as habituais calinadas na língua pátria debitam, em tom condescendente, inanidades sob os regimes monárquicos.
Ah!, mas desejo felicidades aos Príncipes. Muitas.
quinta-feira, maio 20, 2004
Tente-se mandar fazer alguma coisa: arranjar um vidro partido, uma janela, qualquer coisa da casa de banho e pasme-se, meditabunde-se, sobre a fonte de humilhações, aflições e canseiras que essa ambições comedida é: primeiro, surgem os orçamentos 60 mm, som stereo, tecnhicolor, que exigem de nós o trabalho imenso - e é um trabalho imenso - de explicar que não se pretende reeditar Cleopatra, ou pelo menos, parte do cenário, que estavamos mais a pensar num 16 mm, P&B, intimista. Desaparece, nesta altura, grande parte dos pretendentes. Descobriremos, mais tarde, que não eram os piores, que os que ficaram são os verdadeiros killers, dotados de um infalível instinto assassino, mas acobertado sob uma capa de bom senso e de compreensão.
Libertemo-nos ainda destes últimos (admitindo que isso é possivel): que fiquem, da multidão inicial, quatro ou cinco em quem depositaremos todas as nossas esperanças. O problema é que, como logo descobriremos, eles não tencionam fazer seja o que for: somos, para eles, um passatempo, e os nossos apelos lancinantes são motivo para elaborados exercícios de pensée sauvage. Creio, aliás, que estão combinados entre eles e que, no fim de semana, com os telemovéis desligados, comentarão, entre si, as nossas manobras mais inteligentes para obter uma torneira que não pingue ou, simplesmente, apostar sobre o momento que em que se desvanecerão quaisquer résteas da nossa dignidade.
Os estrangeiros que aqui vivem e que passam por estas situações aproveitam para escreverem livros bem-humorados sobre a coisa (ideia que ainda ontem me ocorreu, quando a torneira da casa de banho iniciava o seu sound workshop nocturno). Acontece, porém, que a consciência de sermos cúmplices da situação nos tira a distanciação irónica ou a bonomia para escrever about com algum wit vendável.
É preciso sofrer, sofrer lusitanamente, entre assaltos de descrença e erupções de confiança e fé; no intervalo, rezar e praguejar.
Vou-me munir da novena de S. Judas Tadeu, o santo das causas perdidas.
Libertemo-nos ainda destes últimos (admitindo que isso é possivel): que fiquem, da multidão inicial, quatro ou cinco em quem depositaremos todas as nossas esperanças. O problema é que, como logo descobriremos, eles não tencionam fazer seja o que for: somos, para eles, um passatempo, e os nossos apelos lancinantes são motivo para elaborados exercícios de pensée sauvage. Creio, aliás, que estão combinados entre eles e que, no fim de semana, com os telemovéis desligados, comentarão, entre si, as nossas manobras mais inteligentes para obter uma torneira que não pingue ou, simplesmente, apostar sobre o momento que em que se desvanecerão quaisquer résteas da nossa dignidade.
Os estrangeiros que aqui vivem e que passam por estas situações aproveitam para escreverem livros bem-humorados sobre a coisa (ideia que ainda ontem me ocorreu, quando a torneira da casa de banho iniciava o seu sound workshop nocturno). Acontece, porém, que a consciência de sermos cúmplices da situação nos tira a distanciação irónica ou a bonomia para escrever about com algum wit vendável.
É preciso sofrer, sofrer lusitanamente, entre assaltos de descrença e erupções de confiança e fé; no intervalo, rezar e praguejar.
Vou-me munir da novena de S. Judas Tadeu, o santo das causas perdidas.
quarta-feira, maio 19, 2004
No Abrupto encontrei um poema de Anne de Noialles e esta tarde que ia plácida e sem rumo por entre o calor (que, helàs! não é um puro calor de Maio, mais súbtil e brando que este que faz), zarpou (pega-se numa metáfora inicial e vá de a esgotar até à náusea, procurando "efeitos": assim se escreve mal), retire-se o zarpou, e enfim, o que queria dizer é que me pus a pensar no triste destino da culture française, isto é, parisiense e que, tirando o côté jacobino, é aristocrática, elitista e, por razões de geografia, cosmopolita. Hoje, que Paris não é o já o centro do mundo, le lieu à rendez-vous (honis soyt...)da inteligência, as Viscondessas de Noialles desprovidas de Bunuels e as Condessas de Grefulhes/Guermantes sem Prousts a quem expliquem as relações necessárias do amor a propósito da polinização de uma solitária planta no seu jardim são impossibilidades civilizacionais, luxos incomportáveis.
Não apenas elas, em si, mas o mundo que as produziu e que era o mesmo em que viveu ainda Valéry, os Goncourts de quem Proust troça nos seus pastiches, Rostand ou Cocteau e que se vai tornando uma realidade incomensurável.
Em Portugal não existiu tal mundo, por motivos que poderiam elencar os dados a exercícios de humilhação - actividade de todo desaprovável numa tarde de Maio - mas existia um outro que admirava aquele e sofria com as intransponíveis diferenças. Mas também esse é, já hoje, para a maioria de nós, um mundo perdido e inexplicável.
A tudo isso sucedeu este, em que vivemos, povoado por crenças tecno-populares de aldeões citadinos (seja lá o que isso possa ser).
Cada vez menos as manhãs são a "fraîche renaissance", senão o retomar do cansaço, sans panache.
Não apenas elas, em si, mas o mundo que as produziu e que era o mesmo em que viveu ainda Valéry, os Goncourts de quem Proust troça nos seus pastiches, Rostand ou Cocteau e que se vai tornando uma realidade incomensurável.
Em Portugal não existiu tal mundo, por motivos que poderiam elencar os dados a exercícios de humilhação - actividade de todo desaprovável numa tarde de Maio - mas existia um outro que admirava aquele e sofria com as intransponíveis diferenças. Mas também esse é, já hoje, para a maioria de nós, um mundo perdido e inexplicável.
A tudo isso sucedeu este, em que vivemos, povoado por crenças tecno-populares de aldeões citadinos (seja lá o que isso possa ser).
Cada vez menos as manhãs são a "fraîche renaissance", senão o retomar do cansaço, sans panache.
terça-feira, maio 18, 2004
sexta-feira, maio 14, 2004
Comecei a ler a notícia, naquele apressado e desatento ler matinal, e julguei que se tratava de um excêntrico francês (espécie rara, a excentricidade francesa deve ser previamente licenciadada e homologada por uma qualquer autoridade, seja ela um comité anarca-libertário, ou uma senhora da moda). Mas a notícia em si, ou melhor o seu começo, levava-me a crer ser obra de um excêntrico: tratava-se de uma acção (civil? penal?)contra o exército britânico. Pensei, de imediato, que se tratava de alguma queixa mirabolante e divertida relacionada com estragos provocados por aquele exército quando desembarcou em França, a 6 de Junho de 1944, nas praias da Normandia, e que o queixoso fosse um esteta do arame farpado, um saudosista da colaboração ou do anti-semitismo. Preparava-me para gozar a situação quando o corpo da notícia me desiludiu: a queixa do francês dizia respeito ao Iraque e aos alegados maus tratos infligidos pelo exército britânico aos iraquianos.
Manhã estragada: eu, que gosto de uma boa partida e mesmo de alguma desfaçatez quando cometida com panache, desanimei perante tanta falta de vergonha na cara, da antiga e mais rude, sem sprit ou sombra de panache, por esta boutade de capitulacionista em que parece abundar a nova França.
Manhã estragada: eu, que gosto de uma boa partida e mesmo de alguma desfaçatez quando cometida com panache, desanimei perante tanta falta de vergonha na cara, da antiga e mais rude, sem sprit ou sombra de panache, por esta boutade de capitulacionista em que parece abundar a nova França.
quarta-feira, maio 12, 2004
O Doi-me, um blog hipocondríaco, linkou o Impensavel, que agradece.
Pelo que pude ver, a hipocondria é um tanto incipiente, aquilo a que chamo "hipocondria não esclarecida, frustre ou ingénua" mas o blog é simpático, e se ele diz que lhe dói, quem sou eu para o desanimar...
Seja bem vindo.
Pelo que pude ver, a hipocondria é um tanto incipiente, aquilo a que chamo "hipocondria não esclarecida, frustre ou ingénua" mas o blog é simpático, e se ele diz que lhe dói, quem sou eu para o desanimar...
Seja bem vindo.
Já tinha ouvido falar dela e em 1974 li, em viagem, uma biografia. "Ela" é Lou Andreas Salomé e creio que foi a última das minhas paixões "literárias" adolescentes. Ao folhear, ontem, uma outra edição, encontro um excerto do diário:
"Um diário é um instrumento que não se destina a fixar a recordação de determinados dias, mas sim de factos dissociados do tempo, duradouros. Tão depressa registamos acontecimentos como pensamentos, quando na verdade não visamos nada disso, mas antes um qualquer elemento que a vida faz crescer no seu intervalo"
Uma boa definição também para os blogs, pensei, e mesmo um programa para os blogs portugueses que têm uma desagradável propensão para o artigo de fundo.
Mas, e a terminar, escrevia Andreas-Salomé: "Às vezes é um jardim em flor que ninguém consegue adivinhar por detrás das palavras, a não ser aquele que as escreveu para si mesmo e que, ao vê-las, se recorda como murcha à vista de uma florzinha"
Numa primeira leitura, achei a última frase um péssimo fim e desisti de publicar no meu blog frases "à vista de uma florzinha". Achei a frase possidónia, para não dizer imprópria para uma citação num blog masculino. Depois, já hoje, pensei que Lou era a mulher de quem alguém disse que, quando um homem se apaixonava por ela, dava à luz um livro nove meses depois, a mulher que fez Nietszche fazer inumeráveis tristes figuras e resolvi transcrever tudo.
Que todos nós tenhamos o direito de desfalecer à vista de florzinhas..
E com isto, com a reivindicação do direito a ser ridículo, perdi o fio do post que era bem outro e metia Proust e Camilo e mais alguns daqueles que escrevem obras que crescem no intervalo das nossas vidas.
"Um diário é um instrumento que não se destina a fixar a recordação de determinados dias, mas sim de factos dissociados do tempo, duradouros. Tão depressa registamos acontecimentos como pensamentos, quando na verdade não visamos nada disso, mas antes um qualquer elemento que a vida faz crescer no seu intervalo"
Uma boa definição também para os blogs, pensei, e mesmo um programa para os blogs portugueses que têm uma desagradável propensão para o artigo de fundo.
Mas, e a terminar, escrevia Andreas-Salomé: "Às vezes é um jardim em flor que ninguém consegue adivinhar por detrás das palavras, a não ser aquele que as escreveu para si mesmo e que, ao vê-las, se recorda como murcha à vista de uma florzinha"
Numa primeira leitura, achei a última frase um péssimo fim e desisti de publicar no meu blog frases "à vista de uma florzinha". Achei a frase possidónia, para não dizer imprópria para uma citação num blog masculino. Depois, já hoje, pensei que Lou era a mulher de quem alguém disse que, quando um homem se apaixonava por ela, dava à luz um livro nove meses depois, a mulher que fez Nietszche fazer inumeráveis tristes figuras e resolvi transcrever tudo.
Que todos nós tenhamos o direito de desfalecer à vista de florzinhas..
E com isto, com a reivindicação do direito a ser ridículo, perdi o fio do post que era bem outro e metia Proust e Camilo e mais alguns daqueles que escrevem obras que crescem no intervalo das nossas vidas.
segunda-feira, maio 10, 2004
domingo, maio 09, 2004
O Mar Salgado faz um ano.
O Impensável dá, com muito gosto, os parabéns à ilustre tripulação e, em especial, a Nuno Mota Pinto que linkou o Impensavel pouco depois deste surgir.
O Impensável dá, com muito gosto, os parabéns à ilustre tripulação e, em especial, a Nuno Mota Pinto que linkou o Impensavel pouco depois deste surgir.
Ontem, dia 8, foi o aniversário do fim da II Guerra Mundial na Europa, com a vitória dos exércitos aliados sobre os da Alemanha.
Os exércitos aliados eram, convirá não esquecer, os da Grã-Bretanha e Império Britânico, USA e os da então União Soviética.
Todos eles ocuparam parte da Europa, mas o destino dos territórios ganhos aos alemães foram diversos: os países vencidos pelos alemães e libertados pelos exércitos britânicos e norte-americanos transformaram-se em democracias mais ou menos bem sucedidas (França, Alemanha Ocidental, Itália) e os países ocupados pelo exército vermelho foram sujeitos a ditaduras que só acabaram com o fim da União Soviética.
É desses exércitos, britânico e norte-americano, que ainda hoje esperaria a libertação, caso uma nova ameaça totalitária se abatesse sobre a Europa. Foram esses exércitos, aliás, que resolveram, mais recentemente, a questão dos Balcãs, perante a manifesta incapacidade dos vencidos da II Guerra Mundial, maxime da Alemanha e da França em parar as hostilidades e a carnificina na Bósnia,
Fiquei, por isso, estupefacto e preocupado com as recentes notícias de torturas infligidas pelos exércitos que salvaram a Europa dos horrores da guerra e ver a solidez do funcionamento das instituições parlamentares para que a situação seja esclarecida e punidos os culpados é fraca consolação.
As fotografias da soldado norte-americana (que nunca tinha lido a Convenção de Geneve...) com o seu ar "leve" e divertido e "clean", anti-tabágica, recendendo inocência, reclamando-se da inocência do obedecimento às ordens dadas, fez-me pensar na banalidade do mal de Arendt, ou, mais precisamente, no seu quase reinante "inverso": na "banalidade do bem" que o "politicamente correcto" formula e promove, com a terrível consequência de esquecermos que a humanidade, tida aqui pelo que de melhor há em nós, não é adquirida, ou segura; que, certamente, nunca é banal, mas incerta, por vezes escusa, que é preciso duvidar sempre, temer e tremer perante certezas.
À young woman soldado (terá ela o seu blog?) deixo o conselho: "just say no".
Os exércitos aliados eram, convirá não esquecer, os da Grã-Bretanha e Império Britânico, USA e os da então União Soviética.
Todos eles ocuparam parte da Europa, mas o destino dos territórios ganhos aos alemães foram diversos: os países vencidos pelos alemães e libertados pelos exércitos britânicos e norte-americanos transformaram-se em democracias mais ou menos bem sucedidas (França, Alemanha Ocidental, Itália) e os países ocupados pelo exército vermelho foram sujeitos a ditaduras que só acabaram com o fim da União Soviética.
É desses exércitos, britânico e norte-americano, que ainda hoje esperaria a libertação, caso uma nova ameaça totalitária se abatesse sobre a Europa. Foram esses exércitos, aliás, que resolveram, mais recentemente, a questão dos Balcãs, perante a manifesta incapacidade dos vencidos da II Guerra Mundial, maxime da Alemanha e da França em parar as hostilidades e a carnificina na Bósnia,
Fiquei, por isso, estupefacto e preocupado com as recentes notícias de torturas infligidas pelos exércitos que salvaram a Europa dos horrores da guerra e ver a solidez do funcionamento das instituições parlamentares para que a situação seja esclarecida e punidos os culpados é fraca consolação.
As fotografias da soldado norte-americana (que nunca tinha lido a Convenção de Geneve...) com o seu ar "leve" e divertido e "clean", anti-tabágica, recendendo inocência, reclamando-se da inocência do obedecimento às ordens dadas, fez-me pensar na banalidade do mal de Arendt, ou, mais precisamente, no seu quase reinante "inverso": na "banalidade do bem" que o "politicamente correcto" formula e promove, com a terrível consequência de esquecermos que a humanidade, tida aqui pelo que de melhor há em nós, não é adquirida, ou segura; que, certamente, nunca é banal, mas incerta, por vezes escusa, que é preciso duvidar sempre, temer e tremer perante certezas.
À young woman soldado (terá ela o seu blog?) deixo o conselho: "just say no".
quarta-feira, maio 05, 2004
Abril águas mil e não choveu quase, mas é motivo para estes dias plúmbeos em Maio, ademais sem trovoadas, cinza e chuva "tout court"? Não é.
Por mim, que já tinha encerrado a contabilidade dos chapéus de chuva perdidos esta estação, com resultados que me lisonjeiam (chapéu e meio, já que tenho um palpite sólido sobre onde possa estar o último que comprei), decidi não sair se ameaçar chover. E, esta tarde, desde que acabei de almoçar, tenho estado a calcular as probabilidades de apanhar uma molha se me aventurar rua fora, já que não voltarei a pegar no chapéu de chuva antes de finais de Setembro.
Não posso deixar de referir que se todos partilhassem a minha firme determinação nestes assuntos a vida seria mais fácil. Pactuar com caprichos, eis um erro que não tenciono cometer.
Por mim, que já tinha encerrado a contabilidade dos chapéus de chuva perdidos esta estação, com resultados que me lisonjeiam (chapéu e meio, já que tenho um palpite sólido sobre onde possa estar o último que comprei), decidi não sair se ameaçar chover. E, esta tarde, desde que acabei de almoçar, tenho estado a calcular as probabilidades de apanhar uma molha se me aventurar rua fora, já que não voltarei a pegar no chapéu de chuva antes de finais de Setembro.
Não posso deixar de referir que se todos partilhassem a minha firme determinação nestes assuntos a vida seria mais fácil. Pactuar com caprichos, eis um erro que não tenciono cometer.
segunda-feira, maio 03, 2004
Mea culpa
Acabo de ver, aqui, a transcrição da entrevista de que falei no post anterior.
Modifica, substancialmente, a impressão com que fiquei.
Acabo de ver, aqui, a transcrição da entrevista de que falei no post anterior.
Modifica, substancialmente, a impressão com que fiquei.
Ontem, Domingo, vi, por acaso, parte de uma entrevista dada pelo Dr. João Salgueiro a duas senhoras mal humoradas. O problema, contudo, não é o mau humor das senhoras, mas a inépcia e mediocridade reveladas.
O Dr. João Salgueiro bem tentava falar de problemas graves: a questão do déficit - o estado gasta mais 5% do que arrecada - a questão da falta de estratégia de desenvolvimento económico do país a médio e a longo prazo (e igual falta de estratégia europeia), o problema de um país que tem tantos empregados quanto imigrantes, a necessidade de gerir a Justiça, de reformar a administração pública. Isto é, o Dr. João Salgueiro tentava falar dos problemas nacionais. E eu bem o queria ouvir discorrer sobre eles... As senhoras, contudo, estavam mais interessadas em saber do discurso do Presidente da República e se ele era uma advertência ao governo, ou se, em si, continha contradições.
Talvez em consequência do que lhe estava a acontecer, do total desinteresse das senhoras pelas questões que tentava expor, o Dr. João Salgueiro levantou a questão da responsabilidade do nosso jornalismo pela falta de debate de tais problemas no país. O tempo escoou-se, as senhoras deram por terminada a entrevista.
Eu, por mim, no remanso do sofá, pensava que ficariam ambas muito bem no desemprego.
Infelizmente, porém, atendendo às preocupações de ambas por questões tão tormentosas e facilidade de discernir o essencial do acessório, auguro-lhes um futuro brilhante entre os seus pares.
O TLS tem chegado às segundas-feiras. É muito agradável ler artigos com mais substantivos do que adjectivos, escritos por quem domina o assunto sobre que escreve e não meramente se "desenrasca" sobre ele, por haver lido meia dúzia de artigos.
A propósito, tenho dado por mim a pensar que, com duas ou três assinaturas, cabo, abstenção da imprensa e televisão indígenas - e da grande maioria dos assuntos locais, em geral - e internet, a amazon (fr e uk) e as poupanças bem empregues em fundos internacionais, já disponíveis para qualquer aforrador, não é totalmente doloroso viver aqui. Poderá haver alguma coisa de paternalismo fradiquista nesta minha opinião mas, para quem a natureza não dotou generosamente com o dom do entusiasmo, esta condição de "neo-estrangeirado" é uma solução muito praticável.
O Dr. João Salgueiro bem tentava falar de problemas graves: a questão do déficit - o estado gasta mais 5% do que arrecada - a questão da falta de estratégia de desenvolvimento económico do país a médio e a longo prazo (e igual falta de estratégia europeia), o problema de um país que tem tantos empregados quanto imigrantes, a necessidade de gerir a Justiça, de reformar a administração pública. Isto é, o Dr. João Salgueiro tentava falar dos problemas nacionais. E eu bem o queria ouvir discorrer sobre eles... As senhoras, contudo, estavam mais interessadas em saber do discurso do Presidente da República e se ele era uma advertência ao governo, ou se, em si, continha contradições.
Talvez em consequência do que lhe estava a acontecer, do total desinteresse das senhoras pelas questões que tentava expor, o Dr. João Salgueiro levantou a questão da responsabilidade do nosso jornalismo pela falta de debate de tais problemas no país. O tempo escoou-se, as senhoras deram por terminada a entrevista.
Eu, por mim, no remanso do sofá, pensava que ficariam ambas muito bem no desemprego.
Infelizmente, porém, atendendo às preocupações de ambas por questões tão tormentosas e facilidade de discernir o essencial do acessório, auguro-lhes um futuro brilhante entre os seus pares.
O TLS tem chegado às segundas-feiras. É muito agradável ler artigos com mais substantivos do que adjectivos, escritos por quem domina o assunto sobre que escreve e não meramente se "desenrasca" sobre ele, por haver lido meia dúzia de artigos.
A propósito, tenho dado por mim a pensar que, com duas ou três assinaturas, cabo, abstenção da imprensa e televisão indígenas - e da grande maioria dos assuntos locais, em geral - e internet, a amazon (fr e uk) e as poupanças bem empregues em fundos internacionais, já disponíveis para qualquer aforrador, não é totalmente doloroso viver aqui. Poderá haver alguma coisa de paternalismo fradiquista nesta minha opinião mas, para quem a natureza não dotou generosamente com o dom do entusiasmo, esta condição de "neo-estrangeirado" é uma solução muito praticável.
sábado, maio 01, 2004
O alargamento da UE põe fim à separação europeia que a barbárie nazi e comunista provocou no terrível século vinte e foi com uma emoção que não me suspeitava que vi imagens das populações a celebrar a entrada dos seus países nesta Europa que, para a maioria é, e eles sabem-no, a entrada num mundo difícil, num trabalhoso futuro em branco que se pode ganhar ou perder. Mas não é essa a melhor das apostas? a da Topia?
Com a entrada dos novos países, não sei se Portugal deixará o último lugar nos índices europeus. Se deixar, não nos preocupemos: em breve nos será devolvido, a bem de sonhos com futuros magníficos.
Com a entrada dos novos países, não sei se Portugal deixará o último lugar nos índices europeus. Se deixar, não nos preocupemos: em breve nos será devolvido, a bem de sonhos com futuros magníficos.
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