quarta-feira, fevereiro 28, 2007

A amarga - e de que modo! - queda da bolsa na China e por toda a parte, o pânico no Japão, a cobardia investidora europeia e norte-americana, a bombástica ameaça persa, a inquietante linha de inflação indiana, tudo isto é de um imenso pitoresco! E, contudo, não o vemos: aconselho o retomar do olhar Gilbert & Sullivan e, de um modo geral, toda a capacidade de espanto e divertido terror que perdemos (em nome de numerosas e incríveis palermices) ao longo do nefasto século XX.
Por quem sois, caros leitores, a ideia de que o proletariado chinês se endivida para investir na bolsa - nem sempre sensatamente - e inflaciona o mercado de acções provocando o medo bom gestor do comité central do partido comunista é qualquer coisa de profundamente divertido que alguém deve musicar rapidamente e pôr em cena (esperemos, confiantes, ainda ter dinheiro para o bilhete...).

terça-feira, fevereiro 27, 2007


Henri de Toulouse-Lautrec, Seule, 1896

As notações das senhoras dos blogs - deste e deste - sobre os vestidos das actrizes na cerimónia dos Óscares fizeram lembrar-me deste Lautrec. Não sei se bem.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Dia muito bonito e bem cheiroso. Chegaram mais livros pelo correio. Um deles, a «Arte de Ser Pai», uma recolha das cartas de Eça a seus filhos. Creio que ficará lido hoje. Este Eça da correspondência familiar foi de onde resultou o Eça novo de Maria Filomena Mónica, desatulhado de muitos acrescentos abusivos de épocas posteriores - como bem notou Vasco Pulido Valente.
O livro, uma edição com já alguns anos, é prefaciado, comentado, anotado, por Beatriz Berrini, uma ilustre ecióloga brasileira.

domingo, fevereiro 25, 2007

O meu passeio higiénico acabou por desembocar na Travessa "Limpeza lar" de um hiper, onde gosto de observar a revolução dos descartavéis. Desde há alguns meses, porém, que não há novidades e creio que, mesmo numa época tão estimulante, dificilmente se reproduzirá tão cedo a novidade magnífica que foi o espanador descartável.
Além dos descartáveis, encontrei as crianças e os pais, detectáveis pelos urros e uivos que soltavam. Sim, Miss Pearls, nós não gostamos muito uns dos outros e, creio, pelo que me foi dado ouvir - principalmente ouvir - esse desamor começa em casa. Mães, mães e pais e bebés bem dispostos, deixe-se isso lá para fora, para as viagens, que os de cá preferem os hipers aos jardins e insultam-se entre si com vigor. E não estão mal por lá, desde que longe dos produtos de limpeza, onde gosto de meditar, sossegado.
O dia acabou por não ser péssimo, salvo as nódoas de café no tapete e o ter escrito pronúncio em vez de prenúncio... Bem sei que estava ainda debilitado e que é mais um lapso do que um erro, mas o certo é que passou na revisão e apenas dei pela coisa por, ao reler o texto, me lembrar subitamente de sedas moirées e sussuros de trattative, coisas que, sem escândalo, apenas se reúnem num núncio papal...

Fiquei em casa: li umas crónicas de Tinop e dei uma volta pelos blogs.

sábado, fevereiro 24, 2007

Acordei bem disposto. Se o acordar pode ser prenúncio do dia, quão erroneamente acordei...
Vejamos: ainda agradavelmente sonolento fui arranjar um café, que trouxe para sala e pus na mesa, em frente ao cadeirão. Senti o toque na manga do roupão. E depois, em câmera lenta, assisti ao déluge! O café parecia ter fortes ímpetos distributivos: depois de se derramar sobre o meu roupão atingiu o sofá, tapetes, outra mesa e, nela, toda a papelada que eu deixara cobardemente acumular dentro da taça que está ao meio. Salpicou livros: Berlin e Mann e, menos severamente, a Expiação do Ian McEwan. O pano da camilha - artefacto provinciano onde os provincianos vivem provincianamente no Inverno - é, claro está, branco sujo - e o café não o melhorou. Numa primeira reacção, depois da catástrofe, admirei o que pode fazer um cafezinho contido num xícara tão pequena (cheguei a pôr mesmo a hipótese de haver um fundo falso...): toda a sala me pareceu salpicada. Hesitei entre sentar-me e chorar - chorar longamente - ou ir buscar "coisas" para limpar aquilo. A lembrança de que o cadeirão - que mandei forrar o ano passado - tinha sido fumigado com um produto anti-nódoa e que havia algures um manual a consultar aquietou-me e deu-me ânimo: nada mais interessante do que um manual e um pouco de labor hermenêutico para nos dar a sensação de que a ordem vai regressar e que os nossos piores medos não têm razão de ser. Encontrei o manual - sintético, 1 folha - e parti para a cozinha, já mais animado, em busca de uma tijela que teria de encher de água rigorosamente morna e espuma de detergente (interroguei-me se da loiça se da roupa, mas parece que é indiferente, é mera espuma e gostei deste pormenor simpático)
Muitos vexames depois: creio que debelei a coisa. Descobri, entretanto, que o forro do cadeirão está puído nos braços, pior, apenas num braço! Atendendo à quantia verdadeiramente escandalosa que tive de desembolsar pelo tecido é um escândalo - não vale a pena consultar os preços das etiquetas: um bem elaborado código impede qualquer cálculo certeiro sobre o valor final: há alturas, tem que se ter atenção às larguras e há ajustes, acertos (que variam segundo o padrão do tecido...) e creio que ainda outras armadilhas. A coisa atinge alegremente somas alucinantes e quando dizemos que "nem pensar!" somos conduzidos para outro catálogo onde vemos um tecido muito mais barato, de que sensatamente gostamos, e tudo acaba por ficar mais caro, um pouco mais de 100 ou 200 euros do que aquele, caríssimo, que tínhamos visto primeiro e puseramos logo de parte. Foi a largura, foram os acertos?... Bem, mas este sofá foi forrado há tão pouco tempo, como pode estar puído, por pouco que seja??? Protestarei por telefone (ir à loja é uma péssima solução que nos mete em despesas inesperadas - acreditem).
Depois destas atribulações corri para o duche e resolvi experimentar, à saída, a minha colónia nova, reconfortantemente inglesa, usá-la terapeuticamente, como calmante e revigorante. Erro: de imediato fui imerso num intenso e apavorante cheiro a tintura de iodo e obturaçao dentária dos finais dos anos 60 do século passado que me trouxe à memória o meu problema com a minha dentista (em suma: ando a monte, fugitivo dos cuidados dentários) que não posso adiar mais: terei de me entregar em breve às selvajarias da estomatologia. Este pensamento tem-me envenenado o sábado, e não tenho sequer o meu sofá - ainda está molhado - para nele sofrer.

Se me acontece mais alguma coisa desagradável hoje creio que amuarei por todo um mês.

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Miss Pearls em Madrid também reparou nas crianças a passear nos carrinhos com as mães ou os pais, que não vejo em Portugal sei lá há que tempos - falta de que já me queixei, nuns desses posts aí para trás.
E se fosse só isso... ainda hoje à tarde tinha pensado que em Portugal, nestes tempos, reina a rispidez, a estridência árida, a falta de modos tão mais majestática e desabrida quanto alicerçada numa genuína falta de afecto e cogitei sombriamente em como tudo isso se tem tornado invisível para nós, para mim, pelo menos: é preciso sair daqui para me dar conta do horror disto, da antipatia e da falta de amabilidade indígenas, desta gente zangada e taciturna que somos - ou parece-me a mim que que somos.

Regressar da alegria aristocrática de Espanha a esta sisudez grosseira é uma tarefa muito difícil, de grande rudeza e proponho mesmo que a lei passe a contemplar uma período de aclimatação para os torna-viagem.
Cara Miss Pearls, bom período de adaptação e atenção às nódoas negras.
Este país rescende a pobreza!
Agora é muito elogiada a probidade de Salazar, por ele não ter enriquecido... Ora, Salazar teve - e, em abundância, o que quis e verdadeiramente - lhe - interessava : poder ( e é esta a parte que, pobretes, percebemos mal).
E teve-o, teve todo o poder que quis, grande parte do tempo à revelia e, depois, contra o país ou grande parte dele.
De modo pouco probo (as eleições como na livre Inglaterra, e coisas semelhantes)
Não compreendo, aliás, que os defensores mais engenhosos de Salazar venham com esta questão de ele não ter amealhado uns tostões... Vejamos: Salazar, creio, nem sequer admitiria que o bom ou apenas regular exercício do seu cargo de presidente do conselho pudesse tê-lo enriquecido.
E a exercê-lo de modo reprovável, não havia polícia, tribunais, a legalidade?

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

O post de ontem tem alguma semelhança com uma montra de loja de artigos religiosos, com aquela grande Vanitas, sub-género da natureza morta tão apreciado no barroco, mas era Quarta-Feira de Cinzas, início da Quaresma.

Precisava ir a Lisboa. Vou acabar por ficar por aqui, quase de certeza, na companhia desagradável da minha sinusite, em fase aguda. Impossível fazer outra coisa senão esperar a acalmia das minhas pobres mucosas e que não seja preciso pensar a sério, seja no que for: estou reduzido a uma parte ínfima do crânio: na maior parte dele - onde geralmente gosto de estar quando raciocino - pastam rebanhos vastos de micróbios.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Aqui e ali, nos blogs, publicidade a uma biografia de O'Neill. A minha provecta idade coloca-me naquele já reduzido grupo de gente ridícula que ainda acha a publicidade seguro indício da falta de qualidade do produto anunciado e difícilmente aceita que seja realmente, indiscutivelmente bom como e quanto afiançam; por isso, já decidi não comprar o livro, pelo menos nos próximos tempos.
A única coisa que me poderia demover deste intento seria o perceber que é ridículo apenas querer o que é realmente bom, os valores seguros mas, com o fim do tempo do entrudo, não fazer uso das verdades mais subtis parece-me uma boa renúncia quaresmal.

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

E já repararam que continuamos a crescer muito pouco e a afastarmo-nos da média europeia? Não repararam? Pois continuamos. Não estamos a viver melhor.

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Já repararam que o desemprego em Portugal subiu bastante em 2006? Não? Mas subiu!
Your Ladyship,
Reconhecidamente, agradeço a avassaladora simpatia: o «problema» não era a poesia de O'Neill, mas os micro-segundos em que, lido aquele título, o tal, eu e mais alguns desgraçados, desatenta e angustiadamente, criam que o Bomba, que o Bomba pudesse, horroresco referens! estar prestes a uhm, coff, coff, a desaparecer , mudando - brrrr - para sempre as nossas vidas, para pior, para muito pior.
Com o que,
I have the honour to be
Milady,
Your most humble, obedient servant
Impensado

quarta-feira, fevereiro 14, 2007



I´m an ordinary man

ah, aquela coisa, ontem - foi ontem? - da má língua, do Salazar e não sei quê mais : tão... tão de menos. Acabei por ter dó daquela gente, deve ser muito desagradável ser assim.
Cara Charlotte,

Saberá quanto estimo lê-la e quanto o seu blog se tornou parte dos meus rituais diários. Saberá, ainda, que detesto mudanças, consistam elas em piorias ou melhorias, começos ou fins, tanto de males quanto de bens. Convenha em que todos temos acções menos felizes, que provocam, mesmo à nossa revelia, mal-estar aos outros. Enfim, e indo directa e cruamente ao assunto: aquele título «fim de missão» tem de acabar! Esqueço-me sempre da justificação que já deu a outros desgraçados por ele apavorados, mas é um sobressalto escusado, diria mesmo, uma peripécia - no sentido grego do termo - que subverte a minha felicidade, feita de uma frágil inércia, sempre que deparo com tal título numa das minhas visitas diárias ao Bomba.
Ficaria muito feliz - e creio que falo em nome de muitos - se pudesse mudar o nome.
Antecipadamente grato e muito agradecido,
Leitor assíduo,
Impensado
Já agora.... e eu, onde ouvi falar do Dunne pela primeira vez? Num ensaio sobre Borges? Numa coisa do Eliot? E onde li o que tenho a impressão que li dele? Uma coisa sei: não foi nestes tempos de facilidade googliana: foi noutros, em que se precisava telefonar (começava logo por nunca vir nada na enciclopédia, dizia-se mal da enciclopédia, era a única consolação), sair de casa, ir a casa de amigos, depois de alguns nãos, palpites, lembrarmo-nos de quem, com certeza, tinha ou sabia de quem tivesse ou soubesse... Uma vez, lembro-me (seja-me permitida esta nota de pitoresco septuagenário), que depois dum ror de tempo a correr Ceca e Meca e olivais de Santarém por um livro de que precisava absolutamente, ter-me sentado num sofá em casa de uma amiga de quem ia, creio, despedir-me para sempre, vencido - e dignamente pronto a morrer de desânimo - quando olhei em frente, para a estante, e lá, lá onde eu nunca supusera que pudesse existir tal (era uma coisa de direito), ver a obra que procurava. E vinha isto... ah sim sobre as facilidades de agora. Ninguém imagina como era, ninguém.
Se não viesse aqui agora, logo, quando acordasse, esquecia-me: a Agatha Christie leu o Dunne, o J. W., leu, pelo menos, «An Experiment with Time». Não estou a ver um livro dela onde use as teorias de Dunne, mas o certo é que tem uma boa organização dos tempos e alguns alibis apenas parecem sólidos porque os enquadramos - nós, leitores - em sequências que, de facto, não existem.

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Tenho uma leitura - que é, quase sempre, uma releitura - para dormir. A destes dias tem sido a «Autobiografia» de Agatha Christie, que li pela primeira vez há uns dois anos. É inteligente, bem-humorada e bem escrita. Ontem, li uma descrição de um grupo de viajantes anglo-católicas e da sua leader e guia, uma temível Miss, pelas ruínas bíblicas de Babilónia. Christie transcreve algumas das espantosas afirmações que aquela profere sobre as pobres senhoras do seu grupo e não há dúvida: aquele modo de falar firme, insuportável, eficiente é o discurso de uma vítima plausível, de alguém que podia, com verosimilhança, ser liquidada por qualquer uma das desgraçada excursionistas, por qualquer daquelas poors things ameaçadas de total exaustão, quanto por uma questão de mera sensatez textual. Mas as velhas senhoras continuaram a viagem sem homicídios, no Iraque de há 70 anos, e não deixamos - eu não deixei - de sentir-me defraudado.
Um bom dia de Inverno, triste, chuvoso.

Ontem, estava a ver o "prós & contras" e, embora discordando do assunto das custas (valendo a minha discordância o pouco que vale, creio que a regra da responsabilidade individual pelas custas apenas é aplicável quando, pela mera existência de diversos requerentes/recorrentes haja a possibilidade, ainda que longínqua, da prolação de decisões diferentes, ou então que uma única decisão os possa afectar de modos diferentes, sendo certo que sempre serão diversas partes - sempre dois ou mais assistentes ou arguidos - o que, aqui no caso, manifestamente, se não verifica) bem, embora discordando, pareceu-me que a ideia que o Senhor Conselheiro Sá Nogueira quis transmitir foi a necessidade de cada um de nós não emitir, sobre questões graves, opiniões grátis, um apelo à seriedade na discussão dos assuntos já que as nossas acções têm - sempre - custos.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

O Anarcoconservador está zangado com o país. É uma das condições do ser português, esse desânimo, esse desgosto.
Eu estou triste e pessimista, embora já esperasse o que aconteceu, e por questões de higiene não quis ver as reacções aos resultados. Guardo a minha fúria para depois, para quando a vida começar a ser preterida pela morte, para quando mulheres com doenças graves tiverem que esperar mais tempo por um diagnóstico e por uma operação do que uma menina perfeitamente saudável que ficou grávida (porque estava com os copos?) e se dirige ao SNS - que nós pagamos... -para exigir o seu direito a rapidamente matar o seu filho.
Quando isto acontecer... Bem, quando isto acontecer temos que começar a assistir ou ajudar os mais velhos na sua morte, para haver vagas, digo, em nome da inexigibilidade de sofrimento, da dignidade, etc, etc. Marque-se já o referendo, a morte tem sempre pressa.
Dia soalheiro e tremor de terra - que eu não senti.
Preguicei num depois de almoço contemplativo.
Eu sabia. As rapariguinhas - as de há pouco, ainda teens, ou nos verdes vintes - tinham o ar de quem se ia vingar da vida desagradável, dos tédios do shopping, impondo aqui as coisas lá de fora, as que julgam ser-lhes destinadas. Por outro lado, a interpretação restritíssima da lei e a doce omissão, por parte dos sucessivos governos, de regulamentação sobre a matéria, levou para o sim parte da classe média, que se sentia tutelada e menorizada pela letra e, sobretudo, pela prática dos preceitos legais.
O que estava mal - e estava e não podia continuar como era - podia (e devia) ter sido modificado de outro modo. Como é hábito entre nós, o bom-senso não imperou - como não tinha imperado antes, entre os conservadores - onde me incluo - que quiseram a imobilidade impossível (e supérflua), mesmo que bem intencionada - e,por tudo isto, foi o gosto pelos lances dramáticos, sempre falhos de sensatez, os possidonismos da moda green-gauche, da esquerda-Lisnave-souvenir e a agenda oportunista de um governo medíocre o que ditou o ritmo e a amplitude da mudança.

Não digam é que esta vitória é a entrada no séc. XXI: há 100 anos, já Portugal não condenava ninguém à morte há mais de 50... - fossem quais fossem os veros motivos da abolição, esta estava feita. Em França, na Grã-Bretanha, na Alemanha a pena de morte manteve-se até há vergonhosamente pouco tempo. Nesse capítulo não temos que importar "modernidade" seja de onde for.

domingo, fevereiro 11, 2007

Voltei agora de votar. No referendo de 1998, encontrei ao entrar duas Irmãs Dororeias que, decerto, disseram não. Desta vez, quase no mesmo sítio, encontrei duas meninas que poucas vezes o terão dito.

sábado, fevereiro 10, 2007

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

JPP vem alertar e prevenir as massas - sempre, sempre, ignorantes, sempre a precisarem de esclarecimentos, de quem as ilumine, de quem lhes aclare o sentido de um texto, de quem, em suma, lhes indique o caminho - sobre o artigo do «Avante!» do longínquo ano de 1937.
Lê-se nesse artigo - conforme texto no Office Lounge, via Insurgente que "o aborto é um acto inteiramente anormal e perigoso".
Não vejo, contudo, no resto do artigo - onde se escancara a porta ao relativismo - qualquer argumento no sentido de relativizar a afirmação sobre a anormalidade do aborto mas, apenas, a admissão de causas sociais e económicas que excluiriam a sua ilicitude.
Isto é, nada há que afaste ou diminua o aborto como acto anormal - sem aspas, que se trata de afirmação do «Avante!», onde o que é normal tinha - tem - necessariamente, o sentido da história.
Medite-se sem simplicidades.


Protestos em bairros sociais do Porto
Moradores contra aumentos das rendas


Não admira... Portugal deve ser o único país - arrisco escrever do mundo - em que as rendas sociais sobem bastante mais do que as da habitação normal. Um inquilino de um apartamento dos anos 40 da Rua Castilho - daqueles com 14 divisões - e que o tenha herdado antes de 80 - tem um aumento de 3% contra os 10% ou 20% - mas que podem ser 150% ou 200% - da habitação social... (e o valor da renda em si também tem enormíssimas probabilidades de ser inferior à renda de um apartamento num bairro social do Porto).

O interessante é pensar bem nos motivos que favorecem estas nossas originalidades. Estão relacionados com o subdesenvolvimento, está bem, está bem, mas pensem bem, reflictam. É ainda mais do que isso.

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Sobre os novos humoristas: lia tanto encómio que resolvi ver. E pasmei: os momentos mais felizes contêm-se, em qualidade de texto e representação, no expectável de uma récita de finalistas do 11º ano de qualquer* escola secundária que decalcasse - desleixadamente - alguma britcom.
E era sobre aquilo que se escrevia, se pronunciava a palavra génio?
Houve tempo que Portugal era um país de província. Creio que se tornou num país de arrebalde, pior, de subúrbio, um pais póvoa-de-santa-iria**.
Mas estará tudo doido?
Ou terei eu tido uma congestão e ninguém me disse nada?

* ou de uma das melhorzinhas
** com todo o respeito pelos habitantes da laboriosa povoação, etc.

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

(Creio que, em Portugal, depois da questão do aborto acabará por vir à tona a da "legislação" sobre a adopção de crianças por homossexuais.
Creio que não é necessária qualquer legislação ou permissão ou proibição: o que norteia a questão é o superior interesse da criança - e não o dos adoptantes - e parece-me pacífico que ter uma mãe e um pai, que poder chamar mãe a uma mãe e pai a um pai, está mais perto do superior interesse da criança do que qualquer outra situação. E há milhares de casais nessa situação à espera de poderem adoptar uma criança.)
O Conselho Superior de Magistratura abriu um inquérito ao Juiz Desembargador Dr. Rui Rangel por este ter considerado a decisão aplicada no caso de Torrres Novas "cega brutalmente injusta e desproporcional", violando assim, eventualmente, o dever de reserva.
Bem... cega, a justiça deve ser... Mas quanto ao resto, se tivesse afirmado ser a decisão brutalmente justa e proporcionadíssima também seria alvo de um inquérito disciplinar? É que o dever de reserva seria sempre violado, dissesse o que dissesse. E tantos outros magistrados se pronunciaram sobre o caso...
Antes de adormecer - ainda há pouco! - tinha passado por aqui e aqui (Dupond & Dupont?) e agora acordo estremunhado a) sem saber se Mme. de Grignan era, também, jansenista, o que não deixa de me aborrecer por não saber onde pus as Cartas; b) contente com a justeza da observação de Nancy Mitford numa carta a Waugh sobre a tristeza do narrador em Brideshead que, julgo, me dá razão quando penso que o livro está às avessas; c) a perguntar-me se será o chocolate quente que me provoca estes pesadelos com os jardins de Sissinghurst (que tomo por um roman à clé que adormeço a ler).
Tenho de substituir o chocolate por chá de tília. Ou hibernar, se hibernar for actividade isenta de maus sonhos.

Rembrandt, Paisagem tempestuosa
Chega-me notícia que o Dr. Constâncio se sente de facto incomodado com o valor tão elevado do seu ordenado. Ainda bem. E como ninguém é obrigado a receber o que não quer, falta apenas agir em conformidade. Poderá, por exemplo, ganhar apenas o que ganha o seu colega norte-americano.
Estou em crer, aliás, que já terá tratado do assunto e que apenas por modéstia não publicitou que o fez.

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Para os mercados accionistas e financeiros do mundo inteiro, a notícia relevante do dia económico será o discurso de Ben Bernanke, de onde poderão sair algumas indicações sobre a evolução das taxas de juro do dólar.

Quem é Ben Bernanke? É o director do FED, o equivalente norte-americano de um banco central. Do Banco de Portugal, por exemplo. Às mais óbvias diferenças - não nos esqueçamos que hoje grande parte das atribuições do Banco de Portugal passaram para o Banco Central Europeu - acresce uma outra que já disse uma vez neste blog, por ter sido uma notícia que verdadeiramente me chocou e emparveceu: Ben Bernanke tem um ordenado inferior (em termos absolutos e relativos) ao Dr. Constâncio.
Isto não é uma denúncia populista, é notar a absoluta falta de escrúpulos - e a absoluta impunidade - com que o erário público português é assaltado para alimento deste devorismo. É notar, também, o que é espírito de serviço público nos Estados Unidos e aqui, e isso já é um problema maior, não um fait divers a alimentar indignações popularuchas. Espírito de serviço público e de controlo. Pelo que pude apurar, foram os próprios administradores do Banco de Portugal que se atribuíram tais ordenados. Ao invés, nos Estados Unidos os ordenados de grande parte dos alto funcionários são fixados pelo Congresso e não duvido que aqui se terá que caminhar para uma solução idêntica.
Entretanto, eu gostava de ouvir uma resposta. Não haverá ninguém que pergunte, pausadamente, educadamente, ao Dr. Constâncio se ele não tem vergonha do que ganha, se não sente pejo, se não se sente mal?
Tamino:

Zu Hülfe! zu Hülfe!
Sonst bin ich verloren!
Zu Hülfe! Zu Hülfe!
Sonst bin ich verloren!
Der listigen Schlange zum Opfer erkoren,
Barmherzigige Götter!
Schon nahet sie sich,
Schon nahet sie sich,
Ach, rettet mich, ach! rettet, rettet, schützet mich!
Ach schützet, schützet, rettet, rettet mich!
Rettet, schützet mich!

Die Zauberflöte

sábado, fevereiro 03, 2007

Por aqui, subdesenvolvimento e ignorância:

A política criminal nada tem a ver com a ética? A politica latu sensu nada tem a ver com a ética? A política é uma disciplina da ética!

Entretanto, na verde Suiça,

O Tribunal Federal da Suíça abriu a possibilidade de pessoas com graves doenças mentais serem ajudadas por médicos a porem termo à vida, conquanto tenha indeferido, em concreto, o pedido que deu origem à sentença.

Aqui e lá, a cultura da morte. Lembro-me de achar exagerado o termo quando o ouvi pela primeira vez dito por João Paulo II. Creio que apenas agora começo a perceber bem toda a extensão do problema, o perigo de que, enquanto civilização, abdiquemos a vida: tal como Jacinto, palpamos a caveira e respondemos ao tédio com o macabro - nem sequer já o macabro que dança - e exige de nós o conhecimento dos passos (ou do jogo) - mas outro, de imitação, que já não interroga, nada pede, que cultua uma morte de onde estaremos, afinal, ausentes, passivos, a morte manipulada, a morte bem-estar, a morte-spa.
A pretexto do referendo, uma imensa boçalidade impregna muitos blogs.
Gosto de uma boa bulha mas esta falta de modos - e de tolerância e de respeito e de... - está a passar os limites do suportável.
Voto no Não - fica dito mais uma vez - mas, dado que não tenho nada a dizer que por outros não seja mais bem dito, creio que não será um egoísmo se me dedicar a outros assuntos.

sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Charlotte transcreve o artigo de Vasco Pulido Valente sobre o referendo do aborto.
Poderia ser, e com poucos mutatis mutandis, um artigo sobre um referendo da pena de morte.
E eu votaria, de igual modo, não.

No Da literatura transcreve-se outro artigo, este de Ana Cristina Leonardo que, por sua vez transcreve um texto de um filósofo português, Pedro Madeira: «[...] é, de qualquer modo, falso que, se um ser tem potencialmente um direito, então tem, efectivamente, esse direito. Enquanto cidadão português, sou potencialmente presidente da República; o presidente da República é o Comandante Supremo das Forças Armadas; no entanto, daí não se segue que eu seja agora o Comandante Supremo das Forças Armadas»
Sim, mas... depende da natureza do direito. Aquele de que se fala no texto -a eleição -, desde logo exige o assentimento e colaboração de terceiros (assentimento e colaboração que, se não forem dados, não coarctam qualquer direito).
Já outros há que não dependem senão do decurso do tempo: a maioridade, por exemplo - e o direito regula os direitos do menor enquanto tal e os do menor enquanto futuro maior (regras para administrar o seu património, direito a saber como foram administrados bens que haja adquirido - por via de heranças, por exemplo).
Há direitos concedidos enquanto ainda se não é, para quando se for...
O direito conhece o tempo e as transformações que sofremos nele.
Sobre potencialidades.*

* Modifiquei este post, para correcção de vários lapsos e ideias (menos ideias do que lapsos)...
No Blog do Não

Para além das banalidades:

«Mais: o “autonomismo” tem-se reflectido também na compreensão
da vida intra-uterina: sendo desejada a gravidez, fala-se de bebé; caso
contrário, recusa-se a expressão e, no limite e nos primeiros tempos, diz-se que
não passa de um agregado de células. Como se a objectividade do estatuto,
ainda que conflitual na esfera pública, pudesse depender da pura subjectividade.
Estamos, pois, numa “sociedade de vivência(s)”[...], em que o horizonte tradicional
de procura de fundamentantes razões é abandonado, numa “idade de
incerteza”»
, pg. 14

e ainda (op. cit., loc. cit):


Como assinala Francesco D’Agostino [...], não raro assiste-se a uma
“redução” de uma questão ética a psicológica, tratando o aborto em termos de
uma “dinâmica auto-referencial” e não numa “dinâmica relacional”[...]. Esta última,
verdadeiramente, capta o essencial do problema: a existência de um outro,
ou seja, do filho, cuja vida se deve respeitar. O eixo é, pois, o da relacionalidade [...]
e o da alteridade, devendo recusar-se o poder fáustico e o império da
vontade, advogados pelo “autonomismo
”.

Prof. João Loureiro, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
Ontem, o acólito lembrou os fiéis, principalmente as fiéis, que hoje era dia de Nossa Senhora das Candeias. A origem desta festa é uma procissão pagã, romana, em honra de Ceres chorosa pelo sequestro de Proserpina, com vestais e matronas compadecidas e archotes.

Encontrei no google ditados metereológicos:
- Se a Senhora das Candeias rir, está o inverno para vir.
- Se a Senhora das Candeias chora, está o inverno fora.
- Se a Senhora das Candeias ri e chora, está o inverno meio dentro e meio fora.
Aqui está bom tempo, a invernia vem aí.
Colóquios em obras

- Era preciso aqui uma coisa, assim aquilo lá de baixo já passava e depois era só pôr aqui um igual, mas isso já se arranjava com aquele que ali está, se não fosse aquilo.
- Uma coisa dessas, mas sem ser de metal por causa daquilo. O que estava ainda era a que tinha vindo?
- Acho que sim.
- Só se aproveitasse uma daquelas ali, como aquela para aqui, era só desbastá-la e era capaz de já passar.
- E ali não faz falta?
- Aguenta-se bem.
- É pena é já não haver com os tais três e meio.
- Deve haver, haver deve haver. Há aquelas, iguais às das lá de cima mas têm aquelas coisas de lado, não entram, senão adaptava-se aqui.
- Aposto que na América há.
- O pior é o nome. Como é que eles chamam a isto lá?
- Não sei, mas explicava.
- E na Rua da Prata?
- Talvez, mas não acredito. Isto era ver se na América ainda fabricam, mesmo que já não sejam bem bem iguais.

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

1º de Fevereiro de 1908

São já 99 os anos que passam sobre o assassinato d'El-Rei Dom Carlos I e do Príncipe Dom Luís Filipe.
É um dia de luto para os monárquicos portugueses e deveria ser, ao menos, de meditação para todos os outros: foi em nome de uma ilusão absurda, criminosamente cultivada, que caíram, sacrificados, El-Rei e o Príncipe Real. O sangue desse crime continua, hoje ainda, sobre nós e os frutos dessa ignomínia são esta vil, apagada tristeza que, sem grandeza, não é trágica; que nem sequer é ridícula: é este apagado não ser.