Morreu, neste dia de Primavera, Fernando Gil.
Tinha lido dele, há pouco tempo, a admirável meditação sobre a má fé contida no "Impasses".
Fica aqui um excerto:
"O que é importante aqui, e que tem interesse para o que se segue, é que não se pode identificar a má fé com a mentira pura e simples ou o logro. O vigarista que nos burla não está de má fé: quer simplesmente, profissionalmente, vigarizar-nos, ao passo que a má fé é algo mais profundo, é uma estrutura dotada de uma constância apreciável e com conotações afectivas fortes. Este ponto importa: a má fé é passional. Designa o estado de consciência de um indivíduo, que certamente determina a sua relação com outros indivíduos, mas que, na sua essência é pré-relacional. A expressão "má fé" não descreve uma relação: descreve um estado da consciência. Para o homem de má fé, dada a paixão que o anima, a atitude do outro não pode nunca modificar a sua atitude em relação a ele , enquanto que o vigarista (cuja atitude é impecavelmente não passional) calcula a sua acção em função do nosso cepticismo ou da nossa credulidade."
Já me ocorreu pensar quando oiço ou leio algumas afirmações:" se ao menos fosses apenas vigarista"...
Há uma questão interessante e central na definição da má fé: quem está de má fé, acredita na sua interpretação o que distingue, sempre segundo Fernando Gil, a má fé da ironia ou do cinismo a distinguir daquela, já que: "quanto mais não seja porque os estados de má fé nunca exibem (ou apenas exibem de forma fruste e caricatural) as virtudes da ironia ou se dão ao luxo do cinismo."
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