sexta-feira, fevereiro 27, 2004
É como escrevia há pouco: vento áspero e muito frio. Cá em casa sempre se temeram os Fevereiros e responsabilizavam-se alguns deles pelas longas estadias de parentes em longínquas montanhas. De um deles, condenado a seis ou sete anos de Davos, li quase toda a correspondência, num fim-de-semana que passei em casa de uma irmã sua. Esperanças na cura rápida, primeiras desilusões e contratempos, o habituar-se a um outro tempo, uma paixão exótica por uma filha de um ministro (ou presidente?) de um país da America Latina (Perú? Uruguai? Já não me lembro) e, finalmente os prenúncios - diria, as primeiras suspeitas - de cura. A última carta que li dele, um postal de Veneza, na Praça de S. Marcos, mostrava-o coberto de pombos, sorrindo, no começo dos anos trinta. A viagem de regresso, longa e ziguezaguante desmentia as saudades de casa e de todos os seus que protestava nos finais das suas cartas. Veio a morrer num verão, trinta e cinco anos depois, de congestão, que logo foi atribuída à demasia do sol de Julho. Imolado aos elementos, este Castorp lusitano.
quarta-feira, fevereiro 25, 2004
Manhã inteira sem electricidade - e dadas as modernidades (bombas de elevação que funcionam a energia eléctrica, etc.) - sem água.
Isto quanto à situação externa.
Quanto a internidades, a sinusite transformou a minha cabeça em algo fluído viscoso por onde escorrem gemidos e imprecações, uma ou outra lúgubre ideia. Refugiei-me, acocorado, como um papagaio de mim mesmo, sobre o ombro esquerdo, de onde contemplo toda esta lastimável situação com indizível repulsa e nojo.
Péssimo humor.
Vou amuar.
Isto quanto à situação externa.
Quanto a internidades, a sinusite transformou a minha cabeça em algo fluído viscoso por onde escorrem gemidos e imprecações, uma ou outra lúgubre ideia. Refugiei-me, acocorado, como um papagaio de mim mesmo, sobre o ombro esquerdo, de onde contemplo toda esta lastimável situação com indizível repulsa e nojo.
Péssimo humor.
Vou amuar.
domingo, fevereiro 22, 2004
quinta-feira, fevereiro 19, 2004
Passei rapidamente, o sono urgia.
Mas parece-me que é um blog e seguir com atenção
Amanhã - logo - vou ver melhor o Fogo Grego.
Mas parece-me que é um blog e seguir com atenção
Amanhã - logo - vou ver melhor o Fogo Grego.
terça-feira, fevereiro 17, 2004
À tarde descobri que não tinha selos e fui comprá-los a um daqueles postos de correio automáticos. Este fica logo ali, depois do jardim. Quando virei a esquina, vi o painel dos selos aberto e embrenhado nas parcas entranhas deixadas a descoberto, uma criatura de ar apavorado e infeliz. Perguntei, amável, se iria demorar muito. Ele, que na mão esquerda empunhava uma folhinha A4 com meia dúzia de linhas de instruções, respondeu-me que sim. "Uhm", murmurei eu, com um ar contrariado, "mas é difícil"? Que sim, novamente. Resolvi esperar, sem pressa que estava. Durante cinco minutos olhou aquele papel, que eu fui lendo em olhadelas furtivas. Pareceram-me as instruções pristinas. Eu julgara antes, por um ar que julguei de enfado, que o homenzinho seria um céptico das modernices que, obrigado a conviver, a tratar com elas, exibia o mesmo ar que um marceneiro ateu convicto poria se lhe destinassem como tarefa a amorosa restauração da estátua dos Três Pastorinhos.
Não se tratava disso, porém. O que estava à vista era o que não via há muito, em grau tão elevado de pureza: a velha e simpática burrice, de cara lavada, sem disfarces nem arrebiques, apenas levemente tímida e tristonha.
Comovi-me, desejei bom trabalho, murmurei mesmo algumas coisas sobre "estas coisas que estão sempre avariadas" e pus-me a caminho do correio, imerso na memória das pessoas burras da minha infância, de uma burrice simples e bondosa,um pouco acanhada, e de quem tanto gostei: criadas velhas, um ou outro colega de escola, aquela velha parenta que nunca ouvia bem.
Os selos lá aumentaram outra vez. Não sei onde iremos parar...
Não se tratava disso, porém. O que estava à vista era o que não via há muito, em grau tão elevado de pureza: a velha e simpática burrice, de cara lavada, sem disfarces nem arrebiques, apenas levemente tímida e tristonha.
Comovi-me, desejei bom trabalho, murmurei mesmo algumas coisas sobre "estas coisas que estão sempre avariadas" e pus-me a caminho do correio, imerso na memória das pessoas burras da minha infância, de uma burrice simples e bondosa,um pouco acanhada, e de quem tanto gostei: criadas velhas, um ou outro colega de escola, aquela velha parenta que nunca ouvia bem.
Os selos lá aumentaram outra vez. Não sei onde iremos parar...
segunda-feira, fevereiro 16, 2004
Na sexta-feira passada fiz viagem de Lisboa para aqui. Santa Apolónia deserta, o combóio quase. Li o jornal e, do corredor, espreitei a lezíria.
Depois, nessa noite, já chegado e livre do eu viajante, vi nos mails o convite da Amazon.fr para comprar o último livro do Comte-Sponville "sur le capitalisme". Comprarei, em princípio. Idem, quanto ao "Reading after theory" da Valentine Cunningham. Compras pouco sensatas: ao jantar - pelo menos onde janto - não se fala da moralidade do capitalismo ou de teoria da literatura. Por isso, tenho de comprar umas memórias, ou alguma coisa sobre viagens para os jantares da primavera e do verão. Vi, no outro dia, um livro sobre as do Rei D. Pedro V. Na próxima ida a Lisboa irei investigar se tem algum préstimo para os tempos mortos a meio da entrada, quando o elogio da salada soa a falso e já se disse tudo sobre o sorvete de espinafres.
Depois, nessa noite, já chegado e livre do eu viajante, vi nos mails o convite da Amazon.fr para comprar o último livro do Comte-Sponville "sur le capitalisme". Comprarei, em princípio. Idem, quanto ao "Reading after theory" da Valentine Cunningham. Compras pouco sensatas: ao jantar - pelo menos onde janto - não se fala da moralidade do capitalismo ou de teoria da literatura. Por isso, tenho de comprar umas memórias, ou alguma coisa sobre viagens para os jantares da primavera e do verão. Vi, no outro dia, um livro sobre as do Rei D. Pedro V. Na próxima ida a Lisboa irei investigar se tem algum préstimo para os tempos mortos a meio da entrada, quando o elogio da salada soa a falso e já se disse tudo sobre o sorvete de espinafres.
sábado, fevereiro 14, 2004
O Miniscente, que também já há muito pertence ao rol dos visitados, passou a indicar este "blog" na sua lista.
O Impensavel agradece, obrigado, e promete em breve* reparar a injustiça da omissão do Miniscente na sua lista.
* é que, "acrescentar a lista" pode revelar-se uma tarefa desmoralizante para o autor deste blog. Entenda-se o "em breve" à luz destes factos.
O Impensavel agradece, obrigado, e promete em breve* reparar a injustiça da omissão do Miniscente na sua lista.
* é que, "acrescentar a lista" pode revelar-se uma tarefa desmoralizante para o autor deste blog. Entenda-se o "em breve" à luz destes factos.
quarta-feira, fevereiro 11, 2004
Envelhecer talvez seja, também, isto: perceber que fazemos parte deste soluto de sol e azul - ou do vago cinza dos dias chuvosos - aceitar com gosto que somos uma partícula em suspensão; e libertarmo-nos da natureza saturada e indissolúvel da juventude, da solidez do precipitado.
É um estoicismo de segunda mão, bem o sei, mas o dia está bonito, quero estar ao sol.
É um estoicismo de segunda mão, bem o sei, mas o dia está bonito, quero estar ao sol.
sábado, fevereiro 07, 2004
Hoje, quando abri o computador, fui recebido por uma mensagem de erro grave. O windows superou a situação mas o "informático" a quem telefonei a bradar por auxílio pôs um ar grave e circunspecto.
Além de, na semana que vem, ter de estar longe do pc por um ou dois dias, há esta novidade.
Por isso, se o Impensado for muito intermitente nos próximos dias, peço à minha meia dúzia de leitores que compreenda que não é minha a culpa pelo tremeluzir do blog.
Além de, na semana que vem, ter de estar longe do pc por um ou dois dias, há esta novidade.
Por isso, se o Impensado for muito intermitente nos próximos dias, peço à minha meia dúzia de leitores que compreenda que não é minha a culpa pelo tremeluzir do blog.
sexta-feira, fevereiro 06, 2004
"Aproveitar o bom tempo" escrevi há pouco. É mais complicado do que parece, exige disposição, tempo, esforço. Um passeata pelo jardim a horas de expediente transforma-me em criado grave da culpa, num seu mero acompanhante: "devia era estar a trabalhar" ou "não fiquei de enviar um fax ao outro?". É nisto que consiste - para quem não é uma alma superior - aproveitar o bom tempo: sentir-se culpado, acabrunhar-se a gente por estar de grenha à brisa cálida. Quem acaba por gozar o passeio e o bom tempo é a culpa, "herself", não a gente. Eu acabo prostrado, no sofá, à noite, aflito pelo que não fiz. E tudo isto por causa de um céu Alma Tadema, quase kitsch, de três magras florinhas no relvado mal aparado e de um ar morno e mole, dolente.
O bom tempo, aquele de que eu sempre gostei é o do Inverno, estático e cinzento azulado, ou azul mas muito frio. A gente espreita do gabinete, ouve rugir o vento nordeste, aumenta o aquecimento e continua a trabalhar. E se não fazemos nada, não temos culpa, é do frio, a electricidade está fraca, o aquecimento uma miséria, "tenho a impressão que estou com febre, vou mas é beber um chá quente". Totalmente indolor.
Este entusiamo deste ano por esta proto-primavera, pfff... estou é com um acesso grave de mau gosto, alguma forma rara de de febre-dos-fenos.
O bom tempo, aquele de que eu sempre gostei é o do Inverno, estático e cinzento azulado, ou azul mas muito frio. A gente espreita do gabinete, ouve rugir o vento nordeste, aumenta o aquecimento e continua a trabalhar. E se não fazemos nada, não temos culpa, é do frio, a electricidade está fraca, o aquecimento uma miséria, "tenho a impressão que estou com febre, vou mas é beber um chá quente". Totalmente indolor.
Este entusiamo deste ano por esta proto-primavera, pfff... estou é com um acesso grave de mau gosto, alguma forma rara de de febre-dos-fenos.
quinta-feira, fevereiro 05, 2004
O Rua da Judiaria "linkou" o Impensavel, que agradece.
Tenho perguntas a pôr, curiosidades a satisfazer, mas que pedem outro estado de espírito que não esta espécie de vacuidade, de amolecimento cerebral a que me reduz o tempo ameno.
Tenho perguntas a pôr, curiosidades a satisfazer, mas que pedem outro estado de espírito que não esta espécie de vacuidade, de amolecimento cerebral a que me reduz o tempo ameno.
terça-feira, fevereiro 03, 2004
segunda-feira, fevereiro 02, 2004
Ontem, 1º de Fevereiro, passaram 96 anos sobre o assassínio do Rei D. Carlos I e de seu Filho, o Príncipe D. Luís Filipe.
O assassinato não foi um acto isolado de um louco. Havia quem, por entre a "élite" intelectual republicana pensasse tratar-se de um acto necesssário e o homicídio do Monarca era pedido e instigado de forma quase aberta na imprensa.
O assassínio do Rei e do Príncipe Herdeiro abriu as portas à república, dois anos depois, e que deu o que de todos está à vista.
O Sobreiro, pastel sobre cartão, 1905, El-Rei D. Carlos I
O assassinato não foi um acto isolado de um louco. Havia quem, por entre a "élite" intelectual republicana pensasse tratar-se de um acto necesssário e o homicídio do Monarca era pedido e instigado de forma quase aberta na imprensa.
O assassínio do Rei e do Príncipe Herdeiro abriu as portas à república, dois anos depois, e que deu o que de todos está à vista.
O Sobreiro, pastel sobre cartão, 1905, El-Rei D. Carlos I
Sexta-Feira, desci até ao Rato, daí ao Príncipe Real e continuei pela D. Pedro V até ao Chiado. Espreitei antiquários e alfarrabistas, uma loja que noutros tempos se chamaria de "utilidades", ignorei as livrarias, mesmo a Sá da Costa e lanchei numa esplanada nas adjacências do Rossio. Depois, de táxi até Santa Apolónia. Comprei o bilhete e apanhei um combóio, mas acabei por sair na "Gare do Oriente" (que gostaria se chamasse antes Estação Oriental ou Estação do Oriente, se é essa rebuscada construção ocidental que com tal nome se quis homenagear). Na Bertrand do "Vasco da Gama" vi os livros. Comprei um policial que comecei a ler na viagem e ainda não acabei. E não acabarei esta noite: tenho sono e à terceira ou quarta página adormecerei.
P.S. Os alfarrabistas estavam desertos. E as livrarias. Na Vista Alegre mais gente, alguns estrangeiros.
P.S. Os alfarrabistas estavam desertos. E as livrarias. Na Vista Alegre mais gente, alguns estrangeiros.
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