domingo, novembro 30, 2008

Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.


Fernando Pessoa
(que morreu em Lisboa há 73 anos).

sábado, novembro 29, 2008


Quando doentes - sim, ainda estou - é preciso Accentuate the Positive e não esmorecer.

quinta-feira, novembro 27, 2008

«Portugueses estão entre os europeus que mais desconfiam do próximo, revela inquérito »
também no Público
E com razão, já que a reserva mental é a atitude nacional de um povo pobre e, geralmente, pouco seguro de si. Nasceu como forma de resistência contra o poder que lhe queria cobrar o imposto e não lhe respeitava as ideias, foi impregnando o nosso modo de ser e persiste hoje, resto putrefacto das antigas cautelas campónias.
Há dias, um português com uns copos falava com um castelhano borracho. As frases do português continham uma facada por palavra, rasteira, invejosa, golpe baixo a que não faltava um humor afadistado - ao qual, valha-me a santa indulgência, não deixo de achar alguma graça .
O espanhol, não vendo motivos para estar a ser insultado, respondia com naturalidade e franqueza às canalhices afadistadas, não percebia os subentendidos, que estava a ser desfeiteado, e o outro tirava daquela franqueza desarmada um prazer suplementar. Português e castelhano, os dois com trajes regionais de montar - a conversa decorria entre bestas - pareceu-me o retrato dos nossos países, do nosso bisonho, retorcido e invejoso modo de ser, agora ainda mais aguçado pelos falhanços recentes.
Terei percebido tudo mal? Eu estava um pouco afastado, comia castanhas e as castanhas sempre me causaram alegorias, mas creio que sim, que a imagem não é arbitrária.
Enquanto tento resolver o problema do post anterior, senti-me melhorzinho com a leitura do óptimo artigo de Constança Cunha e Sá no Público.
A não perder, a não perder.
«Até que a voz me doa». Já está - ou pelo menos dói-me quando falo.
O que se faz agora?
Sem febre, mas péssimo. A minha fraca - e mesquinha e vingativa - consolação é o país estar bastante pior.

quarta-feira, novembro 26, 2008

Não tive febre, mas continuo péssimo, uma espécie de estação de vilegiatura, um Baden-Baden para os germes de toda a Europa.
Constipação severíssima: espilros, olhos lacrimejantes, incapacidade de síntese, lembranças de canções francesas douteuses (era cantada pelo Aznavour, mas não achei), a garganta definitavemente afectada, tudo convida ao colapso ou, pelo menos, a dois ou três dias miseráveis.
Ou mais: Se um não posso ainda dizer que estou com um febrão, temo que esteja a preparar-me para isso: 36,9ºC a esta hora não prognostica nada de bom.

terça-feira, novembro 25, 2008

Jornal amável, o Público.
Hoje, a OCDE publicou um relatório que transforma as previsões do governo português em algo de justificável apenas por um ocasional abuso de bebidas espirituosas. Ao contrário das previsões de crescimento, a OCDE prevê a recessão - a tal palavra censurada - e o aumento para níveis alarmantes do desemprego e do défit público, que poderá ultrapassar os 2,9%, colocando-nos, de novo, em situação de infracção às regras da UE.
A mesma organização aponta o decréscimo das nossas exportações como um dos responsáveis por este triste destino (e a melhoria delas não depende do tão amado investimento público, mas de ganhos de produtividade).
Mas, no meio destas declarações sombrias da OCDE, o que diz o amável Público? Isto: que será uma recessão menos acentuada do que na zona euro (sic). O mesmo diz o Sr. Sousa, que aponta a Alemanha como estando com piores perspectivas do que Portugal.
Dito isto, só nos resta esperar pelos imigrantes alemães.

Uma página de Eça de Queiroz
Uma enchente, este 25 de Novembro.

À cabeça, o aniversário do nascimento de Eça de Queiroz, que foi em 1845.

Depois, a lembrança de onde estava no 25 de Novembro. Contei tudo aqui.
Na actualidade: aparece na televisão um senhor psiquiatra a queixar-se que foi perseguido pelo PS, por ter dito que as testemunhas do caso Casa Pia não mentiam; mais: que estaria numa lista de gente a não nomear para cargos políticos. Não me admiro, mas o que faz um psiquiatra em cargos de nomeação política?
No meio de tudo isto, tenho alguma admiração pelo facultativo, que leva a ingenuidade ao ponto de achar que as pessoas normais não mentem. Terá algum cargo no Banco de Portugal?
Espero que os inocentes do caso Casa Pia sejam absolvidos e os culpados condenados. Faltaria demitir - com reforma mínima - aqueles (dezenas?) que lá trabalhavam e que, ao longo de anos, não julgaram conveniente pegar no telefone e ligar para a Polícia (sim, eu sei, é aquela mesma que também não sabia que havia prostituição no Parque Eduardo VII. Também trabalhará para o Banco de Portugal?)
Em sentido contrário, impõe-se condecorar uma das poucas pessoas que pareceu genuinamente preocupar-se com os pobres casapianos e que tentou, ao longo de anos, acabar com a situação: Mestre Américo.
Outra indignação - nada como o frio para realçar a fibra moral - : o dr. Constâncio diz-se vítima de uma perseguiçãoo que nem nos países onde há escândalos muito maiores. Talvez os escândalos envolvam quantias maiores, lá fora, mas os colegas do dr. Constâncio (o norte americano Bernanke, por exemplo) ganham bastante menos do que ele, Victor. Por isso, não se justifica o espanto do ilustre bonzo, não há qualquer desproporção.
Peço desculpa a Eça de Queiroz de o meter no meio deste salmis d'horreurs, como prometia os seus livros das scénas seriam, numa carta célebre a Ramalho.

segunda-feira, novembro 24, 2008

Frio e vento, mas ainda noroeste. Depois roda para nordeste.

Obama apresentou a sua - usou muito mine e my - equipe económica - e falou na possibilidade de milhões (sic) de desempregados no ano que vem.
A bolsa manteve-se em alta.
Mais vale cair em graça do que ser engraçado.

domingo, novembro 23, 2008

Citação obrigatória

«Uma pessoa abre o jornal ou liga a televisão e revê, pasmado, a velha propaganda antidemocrática de 1930. Umas vezes, subtil; outras vezes, muito taxativa e franca. Umas vezes, melancólica, outras vezes, quase triunfante. A miséria geral e perspectiva de uma miséria maior, a fraqueza do regime e uma irritação crescente anunciam o caos. Manifestamente, a bota deixou de rimar com a perdigota.»

Vasco Pulido Valente,no Público

sábado, novembro 22, 2008

Há 45 anos foi assassinado John Kennedy. Também eu me lembro onde estava quando soube a notícia: já andava e articulava algumas palavras e brincava, presumo que sossegadamente, a pouco metros de onde escrevo agora; pediram-me que fosse lá abaixo dizer que o Presidente Kennedy tinha sido morto.
Do depois, lembro-me vagamente de ver fotografias no Paris Match, não sei se devidamente autorizado.

O viandante a braços com as inclemências do tempo e de Heathliff é o narrador.

Vai ouvindo a história que depois nos conta da velha criada, quando, ainda de cama, convalescente da pneumonia que sobrevém a esta aventura, ela lhe faz companhia.

sexta-feira, novembro 21, 2008

Medito, matutino, nas pequenezas que nos protegem dos piores desbragamentos da virtude. A apatia labrega, para falar na mais à mão, é um sorvedouro eficaz de boas e más intenções, tão nefastas umas e outras.

quinta-feira, novembro 20, 2008

Comprar Citigroup? Caiu 23% ontem e 80% num ano.
Uma queda tão convicta possui uma eficácia e um preço - nada de gratuito, aqui - que em vão procuraríamo nas melhores metáforas sobre o destino humano e convoca as piedades gananciosas que o desastre sempre desperta.

quarta-feira, novembro 19, 2008

Uma ideia boa: Padrinhos de Portugal. E há um blog aqui.
O país está num estado miserável, o governo é o espelho do ministro das finanças - o pior da UE, segundo o FT - mas sobra a má fé necessária para tentar que a discussão seja sobre uma frase da leader da Oposição que apenas um cretino não entenderia.
É de meter medo.

segunda-feira, novembro 17, 2008

As imagens de Obama fazem-me lembrar sempre aquelas campanhas publicitárias mais requintadas, aquelas que não dizem logo ao que vêm e fazem de conta que não são publicidade.

domingo, novembro 16, 2008

Continuo a ver pelas televisões grandes galhofas sobre Sarah Palin - e também sobre Manuela Ferreira Leite. Os galhofeiros que, penso, se consideram pessoas sofisticadas, falam depois, com ar sério, do primeiro-ministro português e das ideias dele para Portugal, o país que recentemente foi ultrapassado por Chipre e Malta, Eslovénia e Eslováquia nos rankings europeus e está resolutamente a caminho do fundo em diversos outros índices, o dos cuidados de saúde, por exemplo, em que, só neste último ano descemos vários lugares e já competimos com a Roménia e a dinâmica Bulgária.
Fico um pouco vexado: devem, seguramente, saber alguma coisa que eu não sei.
Algum fair play e digam o que me está a escapar.
Vou inistir até saber.

sexta-feira, novembro 14, 2008

A fotografia a que se refere o post anterior

Questões nunca resolvidas e sempre pertinentes

Onde colocar as notas de texto? No pé da página ou no fim do livro? E, se no fim, por capítulos, ou sem fazer menção deles? E, se por capítulos, recomeçar a contagem ou continuar a ordem das notas?
Todas estas variedades de arrumação têm méritos e deméritos.
Eu prefiro as notas no pé da página, em letras muito pequena e incómoda, com algarismos árabes, usando-se ainda as letras para notas de tradução ou explicações de tradutor ou responsável da edição. Umas e outras devem manter no original as notas que contenham transcrições em grego, latim, francês, italiano (gosto muito das notas em italiano), qualquer língua românica e ainda inglês, alemão; tudo sem qualquer tradução, regra que deve reinar também no texto. Notas em alfabeto cirílico, tamil ou árabe acho um pouco pedante.
Se as notas forem pequenas, parece-me esta questão de arrumação resolvida.
Se são mais volumosas já a coisa muda um pouco e acabo por preferir as notas no fim do livro. E na questão da numeração? Parece-me que uma única ordem, sem recomeçar em cada capítulo é mais cómoda, porque nos podemos orientar com mais facilidade quando folheamos lá no fim, a tentar encontrar, passse a familiariedade, mas, para textos com muitas notas e em papel bíblia não se consegue distinguir pelo volume sobrante de páginas se aquela nota 33 é a referente ao 4º, ou 6º, ou 8º capítulos. E aqui não posso deixar de comunicar um dado curioso: geralmente, quando leio a nota errada, a 33 do artigo 7º quando é certo que estou ainda no capítulo 5º, parece-me aquela referir-se a uma questão tão interessante que não deixo de ir ver o ponto a que diz respeito. Depois de invulgares dificuldades (apenas alguns livros contém a página do livro a que se refere a nota) verifico que, no seu contexto, não apenas é desinteressante quanto fútil, característica que parece partilhar com a grande generalidade das notas de texto.
Lembrei-me, no Inverno passado, de como seria benéfico o lançamento de uma associação dinâmica que combatesse junto dos editores o hábito das notas inúteis ou apenas mais dispensáveis, mas é tal a decadência dos hábitos de leitura que não achei o número de pessoas necessário para fundar a associação e fazer face às despesas notariais e de registo da mesma.
Fico hoje por aqui. A fotografia - que tirei e tem, por isso, os defeitos próprios das obras de amadores - é de um sistema de notas que proporciona uma leitura muito agradável e simples e embora a numeração seja feita por capítulos, a referência da página da nota facilita a consulta.

quinta-feira, novembro 13, 2008

O meu lado james oliver, isto é, cockney, guloso e arruaceiro tem rejubilado com as recentes gemadas de protesto.
Madame de Sévigné não achava muito interessante a história de Roma porque não conhecia lá ninguém. Rio sempre quando me lembro do bon mot da Marquesa (que é uma grande escritora) mas, ontem à noite, num serão de província, enquanto falávamos de um amigo nosso, elogiando-lhe alguns defeitos que lhe estimamos, apercebi-me que eram os mesmos que o Marquês de Fronteira já referia como pertença do ilustre D. de L. - antepassado do involuntário assunto da noite - e que, verifica-se, os não guardou para si; mas, acima de tudo, apercebi-me da justeza da observação de Mme. de Sevigné: é agradável ir por esses livros de história fora e encontrar gente que sabemos muito bem quem é, por lhe conhecermos os netos que, amiúde, são réplicas quase fractais dos seus antepassados, ou de parte deles: de temperamentos, ou de meros gestos e é interessante que aquela tibieza que estudamos a propósito da ida da corte para o Brasil ou a firmeza serena que precedeu a batalha de Valverde nos faça lembrar o modo quase aflito com que fomos perguntados, às vezes poucas horas antes, sobre se valerá a pena ou não aquela compra, ou o modo firme e amigo como nos aconselharam, definitivamente, o vinho que acharam numa prateleira de hipermercado.

quarta-feira, novembro 12, 2008

Que se faz a esta gente?
Em declarações esta manhã à TSF, Isabel Jonet, presidente da Federação de Bancos Alimentares, afirmou que, para que estas instituições possam distribuir frutas e legumes que os agricultores não podem vender, porque não cumprem os parâmetros de qualidade da UE, o Ministério da Agricultura tem de fazer um pedido de autorização à UE. "O nosso pedido foi feito ao senhor ministro mas ainda está sem resposta", afirmou Isabel Jonet.

Do "Público"

terça-feira, novembro 11, 2008

Foi há 90 anos, no 11º dia, do 11º mês, à 11ª hora que as armas se calaram. Tinha acabado a I Guerra Mundial.
Não sei de nenhuma cerimónia em Portugal - embora tenham morrido milhares de soldados portugueses no conflito.
Não sei quando, mas foi há muito tempo que ouvi falar pela primeira vez da Ultramarina, do José Maria Costa e Silva (Almarjão) e não foi há muito menos a primeira vez que lá fui. Ainda me lembro porquê: queria umas coisas do António Ennes sobre Moçambique, que teriam influenciado o pensamento de Eça de Queiroz sobre o império português por alturas da concepção d'A Ilustre Casa. E lá estava, fazendo jus ao que me haviam dito: «aí encontra-se tudo, ou ele arranja, ou sabe onde está» e muitas vezes depois, ouvi o seu nome por ocasião de achamentos miraculosos de obras que se julgavam há muito perdidas. E, também, sempre, do seu amor dos livros, pelo papel velho.
Está de luto a gente da livralhada que ele há-de estar já na primeira antevisão de uma eternidade de velhas edições por encontrar, que é o céu dos que amaram de todo o coração os velhos livros.

segunda-feira, novembro 10, 2008

Depois do sol...

Fez-se noite com tal mistério,
Tão sem rumor, tão devagar,
Que o crepúsculo é como um luar
Iluminando um cemitério . . .

Tudo imóvel . . . Serenidades . . .
Que tristeza, nos sonhos meus!
E quanto choro e quanto adeus
Neste mar de infelicidades!

Oh! Paisagens minhas de antanho . . .
Velhas, velhas . . . Nem vivem mais . . .
— As nuvens passam desiguais,
Com sonolência de rebanho . . .

Seres e coisas vão-se embora . . .
E, na auréola triste do luar,
Anda a lua, tão devagar,
Que parece Nossa Senhora

Pelos silêncios a sonhar . . .

Cecília Meireles
Das minhas hierofanias de Novembro, Moby Dick, algumas linhas abaixo. Virão agora as serenidades, que relembrei quando as encontrei ontem em Cecília Meirelles - fazia anos que morreu. Falta Emily Brönte, o frio no meu quarto, e meia dúzia de outros assombros diáfanos.

sábado, novembro 08, 2008

Todo o universo se compunha do mesmo, aventa o físico.
E deve ser verdade: o ruído de fundo do universo é muito semelhante ao bocejo.


E a propósito de Beckford, agradeço ao acaso amável que me pôs a sua prosa debaixo do meu nariz, anteontem. O meu exemplar do Diário em Portugal tinha desaparecido há uns anos, vítima de uma deficiente política de empréstimos de livros, que demorei anos a definir em termos menos ruinosos.

sexta-feira, novembro 07, 2008

Um dos problemas de viver num país pobre e atrasado, para quem não confunda subdesenvolvimento com Arcadia, é a incomodidade geral, que começa pelas pequenas coisas: William Beckford fala, em 1794, do horrível ladrar e uivar dos cães. Duzentos e alguns anos depois, a coisa não melhorou muito e qualquer viajante do mundo civilizado não excessivamente afortunado pode enviar para o seu jornal saborosas crónicas sobre os estranhos, bárbaros e pitorescos hábitos dos indígenas lusos. E, em relação ao mundo civilizado, longínquos. Sobretudo longínquos.
Ronda nocturna
Sempre, mas sempre, suspeitei que as senhoras se divertem muito mais do que os homens. E há quem se divirta a confirmar a minha suposição de um modo revoltante. A vexante descoberta foi feita via Miss Pearls.

quinta-feira, novembro 06, 2008

Li agora um artigo sobre a tarefa ciclópica que espera Barack na Casa Branca e pensei para mim que não seria nada mau que ele tentasse e conseguisse repor os USA no estado de prosperidade em que se encontravam no já mentalmente longínquo ano de 2006, quando a economia - não apenas as finanças - estava próspera e ainda não havia maioria democrática no Congresso.
Não seria nada mau.
P.S. Não pude deixar de apreciar devidamente a referência feita pelo presidente eleito a sua mulher, a future first-lady of the nation. Da nação! Estes ridículos tão republicanos dos USA deliciam qualquer monárquico.
O momento mais digno da noite de ontem, como bem se refere aqui.

quarta-feira, novembro 05, 2008

Não gosto do Obama. A minha única consolação pela sua eleição é... ter sido eleito e vir aí o tempo dos actos.

Por aqui... por aqui, sabe-se que o governo depositou 500 milhões de euros num banco em situação difícil, suspeito de ilegalidades e o ministro das finanças ladeia a pergunta feita no Parlamento por um deputado (Louçã) usando o sigilo bancário como desculpa! Este tipo de resposta papalva põe-me fora de mim, pela mera possibilidade da sua existência. Se estivessemos num pais, não direi já do 1º mundo europeu mas, vá lá, de 2ª linha, diga-se, ao nível do Paraguai, um ministro não proferiria uma boutade destas e, se quisesse fugir à pergunta, fá-lo-ia de um modo se não verosímil, com alguma graça, usando um daqueles artifícios retóricos que nos fazem vacilar no gosto pela honestidade.
Aqui é isto... Toda a gente sabe que o sigilo bancário protege o cliente, o depositante. Se escrever neste blog que tenho 1000 euros depositados no Banco X, na conta Y não estou a violar nenhum sigilo bancário, porque sou eu o titular e o destinatário do direito ao sigilo. Por isso, o estado, depositante dos milhões, pode muito licitamente - e deve - dizer quanto e onde depositou. Ou seja, a resposta do ministro é, não apenas um atropelo à democracia, mas uma tolice que conta com uma ignorância ainda maior que a dele. Que tais infantilidades apalermadas sejam ainda possíveis eis a tragédia.

P.S. O pedido para que a oração fosse ouvida, de Purcell, em nada se relacionava com a eleição norte-americana.

terça-feira, novembro 04, 2008

Purcell, Hear my prayer
[...] Circumambulate the city of a dreamy Sabbath afternoon. Go from Corlears Hook to Coenties Slip, and from thence, by Whitehall northward. What do you see? - Posted like silent sentinels all around the town, stand thousands upon thousands of mortal men fixed in ocean reveries. Some leaning against the spiles; some seated upon the pier-heads; some looking over the bulwarks
of ships from China; some high aloft in the rigging, as if striving to get a still better seaward peep. But these are all landsmen; of week days pent up in lath and plaster - tied to counters, nailed to benches, clinched to desks. How then is this? Are the green fields gone? What do they here?
But look! here come more crowds, pacing straight for the water, and seemingly bound for a dive. Strange! Nothing will content them but the extremest limit of the land; loitering under the shady lee of yonder warehouses will not suffice. No. They must get just as nigh the water as they possibly can without falling in. And there they stand - miles of them - leagues. Inlanders all, they come from lanes and alleys, streets and avenues, - north, east, south, and west. Yet here they all unite. Tell me, does the magnetic virtue of the needles of the compasses of all those ships attract them thither?
Melville, Moby Dick, logo após o mais espantoso início de um livro que até agora li. O Moby Dick veio juntar-se ao Monte dos Vendavais nas minhas leituras dos novembros de outros tempos. Mas continuo a ler uns excertos por estas alturas, ou Whenever I find myself growing grim about the mouth; whenever it is a damp, drizzly November in my soul.

segunda-feira, novembro 03, 2008

Vejo esta gente a falar da Dra. Manuela Ferreira Leite com uns desdéns tais que a diríamos a viver no gozo de um governo presidido por um génio político, num país próspero e bem sucedido, requintado, numa democracia sólida, profunda, profícua.
Agora, das duas uma: ou eu me perdi dessa realidade radiante e, por culpa minha, vim parar a um beco de amargura, onde vivo um pesadelo triste e alucinado com um país em crise, que empobrece diariamente, paralisado, sem ideias nem vitalidade e que, segundo todas as estatísticas fiáveis, tem regredido e apenas progride no ranking da corrupção, num país onde se decidem assuntos de milhões e que afectam milhões sem critérios claros, num país regido pelas saloiíces de um primeiro-ministro diplomado a um domingo e que consegue cobrir-se de ridículo no continente dos generais alcazares, num país que...
Fui eu que ensandeci, aqui perdido num beco?