Serviço Público
«Onde está o Sócrates decisivo, determinado, "duro", que não dobrava nem torcia? Onde está o Sócrates que punha os privilegiados na ordem, a bem do povo e do futuro? Onde está esse ferrabrás que varria a feira? Está hesitante, inseguro, sem saber se avança ou se recua e está, sobretudo, sozinho. As primeiras "reformas", que foram feitas contra a gente indefesa, como os reformados, pareceram provar que ninguém lhe resistia, excepto como de costume um PC inócuo. Mas, pouco a pouco, com a ajuda da estagnação económica e de um autoritarismo cada vez mais presunçoso e fátuo, as coisas começaram a mudar. A televisão e os jornais deixaram de o poupar e os portugueses saíram para a "rua". Às dezenas, primeiro, e a seguir aos milhares. Os comunistas, claro, mas também o cidadão comum que nunca na vida se "metera em nada".Imediatamente a íntima fraqueza da personagem ficou à vista. Por um lado, o primeiro-ministro deu em fazer a sua própria apologia, com a fogosidade e o exagero de um treinador de futebol: a vaidade é frágil. E, por outro, cedeu à berraria que vinha de fora, demitindo Correia de Campos. Não percebeu dois pontos de uma luminosa evidência: que o sacrifício de Correia de Campos se reflectia nele e o tornava vulnerável; e que não se concilia um adversário fugindo e, ainda por cima, fugindo em puro pânico. Os professores, que desceram ontem a Lisboa, traziam Correia de Campos na cabeça e, agora, quer a ministra fique, quer não fique, o tempo das "reformas" já passou. O "anti-Guterres" falhou como falhou Guterres. Pior ainda: falhou com muito menos dignidade. A manifestação do PS da próxima semana não é, como se disse por aí, uma resposta à "rua". É uma típica "manifestação de desagravo", essa velha missa de fiéis defuntos para gozo e glorificação do chefe, de que Salazar tanto gostava. Se fosse uma resposta seria com certeza uma entrevista na televisão (desta vez não negociada), em que Sócrates mostrasse um módico de força e de firmeza e, com sorte, conseguisse convencer o país que não tencionava governar para a hipotética maioria de 2009. Só que Sócrates, hoje provavelmente espantadíssimo com a ingratidão da Pátria e a irracionalidade dos portugueses, governa mesmo para a maioria em 2009. E para isso precisa de cultivar a fantasia do "anti-Guterres", de que aliás se orgulha, e fazer, de facto, o que Guterres fez. Não é possível.»
Vasco Pulido Valente
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