sábado, outubro 25, 2003

Há tempos lia umas memórias - poderiam chamar-se de uma menina bem comportada de proví­ncia, tão placidamente relatam quotiadanos que, para o leitor de hoje, são pura arqueologia.
Nelas descreve o serviço de jantar de "todos os dias" da sua infância, com a representação do episódio de D. Fuas Roupinho.

Também, na minha casa da praia, havia esse "serviço de todos os dias" "cavalinho" da Fábrica de Sacavém, como agora sei que se chama e, igualmente, julguei que o cavaleiro era o miraculado da Nazaré. Um dia perguntei, riram-se - amavelmente, embora - e explicaram-me que não, que reparasse, era uma estátua equestre, entre ruí­nas num jardim, como havia nos jardins e parques antigos.
Eu, que tantas vezes pedira ao cavaleiro, que também, julgava um santo - por ter sido salvo do demónio - fizesse desaparecer o restos de fí­gado, de peixe, da clara do ovo estrelado, tive um dos meus primeiros e mais acerbos desgostos de fé, os que ferem a absoluta capacidade, não de crer, mas de crer que Tudo em todas as coisas está, benfajezamente.
Sarei essa ferida, mas o tecido cicatricial, delicado e transparente, a pele nova e rósea, foi o da desilusão.

Esclareci, um dia, a Autora das memórias que não era, não era D. Fuas, mas um motivo de inspiração quase seguramente inglesa.
Ça va sans dire: herético.




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