domingo, novembro 20, 2011

Do Público
O fim da "Europa"
Vasco Pulido Valente - 20-11-2011


«A Grécia é hoje governada por um burocrata da União Europeia, a Itália é hoje governada por um burocrata da União Europeia. Portugal e a Espanha ainda não são; mas Portugal tem um ministro das Finanças que veio direitinho da União Europeia e está submetido ao escrutínio periódico de uma troika, dois terços da qual vêm da União Europeia. Toda esta gente impõe a retalho ou por grosso a política económica que bem entende e, quando muito, aos parlamentos nacionais, se lhes dão licença, ratificam o que foi decidido sem eles, por formalidade e decência. Mas se por acaso discordam, a punição verbal ou financeira dos seus caridosos patronos depressa os sossega. Fernando Ulrich protestou contra o poder dos funcionários de sétima ordem [*] que por aqui aparecem. Não lhe servirá de nada.

Evidentemente, quem deve fica nas mãos dos credores. Sucede que a União Europeia não é um credor (pelo menos, não é um credor directo) e a sua intervenção passa em princípio por uma ajuda. Ora entre ajuda e tutela há uma enorme diferença, que nem sempre se nota na atitude e no comportamento da troika. Basta pensar que uma frase ambígua de um senhor qualquer dessa superioríssima entidade sobre salários no sector privado espalhou uma onda de pavor por Portugal inteiro. Pior ainda, apesar de um ocasional acesso de retórica a benefício dos metecos do Sul, Angela Merkel recusa tomar as medidas que resolveriam ou abrandariam a crise das dívidas soberanas. Do ponto de vista dela, uma posição compreensível e lógica. Do ponto de vista da Grécia, de Itália e de Portugal, uma catástrofe que os conserva num extraordinário estatuto de menoridade.

Além disto, a sra. Merkel e os seus sócios, levando o sr. Sarkozy pacientemente atrás para propósitos de camuflagem, mandam hoje na União Europeia contra o protocolo e a legalidade. O famoso "clube de democracias" que a UE nos bons tempos gostava de se proclamar (e mesmo esquecendo as semidemocracias da Itália e da Grécia) acabou por se transformar numa espécie de protectorado da Alemanha, a que ela de resto se achava destinada. Na ausência da América e da Inglaterra que durante quase meio século impuseram um certo equilíbrio na "Europa", coisa ignorada e frequentemente detestada, a inclinação para a Alemanha era inevitável. A UE torna este destino mais simples, mas não o criou.»

[*] - Era preciso serem de 1ª linha para exactamente o quê?

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